O ensino de piano na Escola de Artes Veiga Valle e no Centro Livre de Artes em Goiânia-GO: um estudo investigativo sobre projetos pedagógicos em música

 

Greco, L

Barrenechea , L

 

Escola de Musica e Artes Cênicas

 

larapuppy@hotmail.com

lucia.barrenechea@brturbo.com

 

Educação Musical, Piano, Musica.

 

A Escola de Música e Artes Cênicas da UFG oferece o curso de licenciatura em música que vai formar o professor de música para escolas de ensino regular e o professor de instrumento musical e canto. O momento crucial do curso de licenciatura ocorre na disciplina Didática, durante a realização de estágio, que é quando o aluno vai travar contato com o ensino em tempo real. A partir do conhecimento de como, para quê e a quem é dirigido o ensino de piano nas escolas, o aluno de licenciatura em instrumento musical poderá ter um melhor rendimento na realização de seu estágio. O professor formado nestes cursos deve desenvolver uma filosofia de trabalho e adotar metodologias coerentes com esta concepção. A investigação dos projetos pedagógicos dessas escolas visou verificar se a realidade do professor em formação na universidade condiz com a realidade do exercício da função atualmente. Através da análise da elaboração do programa de estudo para o curso de piano destas escolas foi possível determinar o perfil do aluno formado e investigar se os programas estão de acordo com as finalidades propostas. O programa de estudo reflete o projeto pedagógico das escolas analisadas, e a maneira como ele funciona verifica a sua eficácia e a objetividade

A história da pedagogia do piano caminhou paralelamente com a historia da filosofia da educação ao longo dos séculos. O piano surgiu na Europa no século XVIII, popularizando-se no século XIX. A didática então, segundo Haidt (2002), utilizava-se do método de memorizar conceitos sem reflexão por parte do aluno, que atuava como receptor/reprodutor dos conhecimentos transmitidos verticalmente pelo professor. Segundo Libâneo (2001), estas características da Pedagogia Tradicional, que ignora os princípios de desenvolvimento e funcionamento do intelecto humano estudado pelas teorias cognitivistas. Nesta concepção, surgiu o que Camp (1981) denomina a “Escola dos Dedos”, predominante nos primeiros séculos de existência do piano, defendendo a automatização dos movimentos sem reflexão. O programa adotado neste sistema visava desenvolver as habilidades mecânicas do candidato à pianista através de exercícios técnicos. No século XX, surge na pedagogia a influência das descobertas científicas de Jean Piaget (1896) sobre os processos cognitivos, da psicologia da Gestalt e das filosofias embasadas no pensamento de John Dewey (1859-1952), que desenvolveu teorias sobre o desenvolvimento do pensamento reflexivo. No ensino do piano, o foco eh direcionado para o desenvolvimento e a utilização da percepção aural na performance, na fluência da linguagem musical e no conhecimento funcional sobre as estruturas fisiológicas do movimento.

Este projeto caracterizou-se como uma pesquisa de natureza qualitativa, que envolveu o método fenomenológico, e foi dividido em cinco etapas, onde primeiramente foram levantados dados bibliográficos e documentais para uma análise posterior, seguido da realização de entrevista com as professoras supervisoras da área de música das duas instituições e da análise das entrevistas com cruzamento de dados bibliográficos e documentais, finalizando com a redação do trabalho.

Nas escolas pesquisadas, são oferecidos cursos básicos de piano, estruturados dentro de uma grade de matérias interdisciplinares. Normalmente, a formação básica de piano, ou de outro instrumento musical, se constrói em um período de tempo relativamente longo, e nestas escolas, os alunos dispõe de pouco tempo para isso: três anos no CLA, e quatro na Escola de Artes Veiga Valle, sendo que o CEP funciona como uma extensão por mais dois anos do curso básico oferecido por esta ultima escola, com caráter profissionalizante. Podemos definir, através das entrevistas com as diretoras, que o perfil de aluno que estas escolas recebem é, na sua maioria, de baixa renda, sendo que muitos deles vão buscar uma qualificação profissional no estudo da música. No programa do CLA, é possível que o aluno iniciante se familiarize com os princípios básicos da música, e seja introduzido no estudo de um instrumento musical, enquanto que, para os alunos que já tem algum conhecimento musical, as questões negligenciadas na formação são trabalhadas. O programa da Escola de Artes Veiga Valle e do CEP enfatiza uma linguagem improvisatória, através de um plano de aula desenvolvido pela professora Áurea Maria Pinto das Neves, necessária ao profissional que vai atuar profissionalmente como pianista popular e acompanhador, ou compondo arranjos e jingles. Para a preparação do pianista que deseja atuar na música erudita, ainda é necessário abordar um repertório mais complexo dentro dos programas de piano destas escolas. Existem semelhanças entre os programas do CLA e da Escola de Artes Veiga Valle/CEP, no que diz respeito aos métodos utilizados. O repertório adotado deveria ser desenvolvido em um tempo maior, para poder abordar as obras mais complexas e significativas do repertorio pianístico. Nas duas escolas observadas, o aluno de piano é estimulado a tocar em conjuntos musicais e a atuar como performer em recitais e apresentações públicas, aproximando o conteúdo das aulas da vida prática do aluno.

De acordo com as entrevistas com as diretoras das escolas pesquisadas, as aulas de instrumento musical são ministradas por bacharéis em instrumento, e não professores licenciados. Isso é conseqüência natural da oferta de cursos de música na UFG até o ano de 2000, que consistia em duas opções: o bacharelado em instrumento ou canto, com ênfase na formação do performer e o curso de licenciatura em música, com ênfase na formação do professor de música para atuar em escolas de ensino regular. Tal situação tende a mudar com a recente criação dos cursos de licenciatura em instrumento musical e canto oferecidos pela EMAC/UFG, que formou em 2003 a sua primeira turma de licenciados em Educação Musical-Instrumento Musical e Canto. A EMAC reformulou as grades dos cursos de licenciatura, transformando o curso de Licenciatura em Educação Artística com habilitação em Música, no curso de Educação Musical, que agora oferece duas modalidades de licenciatura: Ensino Musical Escolar, voltada para a musicalização e a educação musical em escolas do ensino regular, e a licenciatura em Instrumento Musical e Canto, voltada para o ensino de um instrumento específico, ou canto, onde o aluno desenvolve as habilidades de performer, mas com ênfase na didática. Os cursos de bacharelado em instrumento e canto foram reformulados, tendo adquirido um foco maior em matérias práticas e na preparação para a performance, não existindo nenhuma matéria que aborde a didática do instrumento na grade. É importante ressaltar que, mesmo com formação de bacharelado em instrumento musical, percebe-se que os professores das duas escolas se empenham arduamente no sentido de buscar conhecimentos na área pedagógica.

Ficou evidente na pesquisa que, por se tratar de escolas vinculadas ao governo municipal e estadual, existem normas que regulam o seu funcionamento e sua atuação, tanto na duração, como no caráter dos cursos oferecidos. O CLA atende a comunidade mantendo uma alta rotatividade entre os alunos, tendo por isso optado por um curso que oferece uma formação básica, estruturado em um período curto de tempo. Existe também um curso de extensão para os que aspiram ingressar na graduação em música oferecida pela UFG, aberto tanto para os alunos do CLA, como para outros estudantes, que já tenham um domínio satisfatório do instrumento. Existe uma função social desempenhada por estas escolas, especialmente na Escola de Artes Veiga Valle / CEP, que têm nesta função social uma filosofia de trabalho, direcionando a formação dos alunos para o ensino profissionalizante, procurando refletir as necessidades do mercado de trabalho atual na grade do curso. Além disso, existe um trabalho de formação de platéia e integração da formação que o aluno recebe com a sociedade em que ele convive. A inserção do aluno destas escolas na graduação em Música ou Educação Musical, oferecida pela UFG, pode ser encarada como um objetivo, mas não é o foco principal, de acordo com a análise dos programas do curso de piano oferecido nestas instituições.

Com este trabalho buscou-se proporcionar uma visão mais clara do funcionamento, estrutura e filosofia de ensino de duas escolas públicas de música em nível fundamental e médio, enfocando o ensino do piano. Ao identificar e investigar os mais variados aspectos que envolvem o ensino de piano nessas escolas, esperou-se criar um canal de acesso para a consolidação de parceria com a universidade, no sentido de sistematizar a realização de estágio dos alunos de licenciatura em instrumento musical da EMAC nas duas instituições, que, potencialmente, podem vir a ser local de trabalho destes futuros profissionais de ensino.

 

Referências Bibliográficas

 

BASTIEN, James W. How to teach piano successfully. 3a ed. San Diego: Kjos, 1988.

CAMP, Max. Developing Piano Performance: a Teaching Philosophy. Van Nuys: Alfred Publishing, 1981.

CARVALHO, Vívian Deotti. O professor de piano em escolas públicas de música de Goiânia e seu perfil acadêmico e profissional. Goiânia, 2004. Relatório de pesquisa – Escola de Música e Artes Cênicas, Universidade Federal de Goiás.

FERNANDES, José Nunes. Caracterização da Didática Musical. In: Cadernos do Colóquio, s./v. Rio de Janeiro: CLA/Uni-Rio, s./d.

HAIDT, Regina Célia Cazaux. Curso de didática geral. São Paulo: Ática, 2002.

LIBÂNEO, José Carlos. Didática. São Paulo: Cortez, 2001.

MARTINS, José do Prado. Didática geral. 2a ed. São Paulo: Atlas, 1993.

UZLER, Marienne; GORDON, Stewart e MACH, Elyse. The Well-Tempered Keyboard Teacher. New York: Schirmer, 1991.