Entonação – seus temas e desafios no ensino de lingua inglesa

(um estudo de caso)

MONTEIRO, N. P.

Faculdade de Letras – UFG

nepam@ibest.com.br

mcfd@letras.ufg.br

Palavras-Chave: entonação, identidade, língua inglesa, percepção.

Introdução

Nesse estudo de caso, procuramos averiguar os resultados da aplicação de um conjunto de atividades de ensino de entonação a um grupo de dezesseis aprendizes da língua inglesa no curso de graduação em Letras da UFG. As atividades foram desenvolvidas para aplicação em vinte e dois encontros durante um semestre do ano letivo de 2003. A fundamentação teórica foi escolhida para abarcar os aspectos lingüísticos (Brazil, 1997), operacionais (Chun, 2002) e cognitivos (Searle, 1995; Tomasello, 2003; Vigotski, 1997) envolvidos no desenvolvimento e aplicação das atividades, as quais podem ser divididas em dois tipos: atividades de percepção dos movimentos tonais conduzidas no laboratório de informática e atividades em pares realizadas em sala de aula. A avaliação das atividades, porém, não se limitou às questões lingüísticas e cognitivas, uma vez que foram levadas em consideração as opiniões e posições identitárias assumidas pelos alunos durante o período de trabalho com o grupo (Woodward, 2000). Para tornar essas questões operacionais, foram propostas as seguintes perguntas de pesquisa:

  1. É possível promover o desenvolvimento da percepção da entonação dos aprendizes de língua inglesa através da aplicação de atividades didáticas formuladas para este fim?
  2. Quais tipos de atividades são mais eficazes em promover esta percepção?
  3. Que elementos das atividades, do contexto e dos sujeitos da situação de ensino incidem sobre o processo e os resultados da aplicação das atividades de ensino de entonação?
  4. Como esses elementos podem orientar a elaboração e aplicação das atividades de ensino de entonação em programas de ensino de língua inglesa?

Para responder a essas questões, adotou-se a perspectiva interpretativa que caracteriza os estudos de caso, conforme a explanação na seção a seguir.

Metodologia

De acordo com Nunan (1992) e Johnson (1992), os estudos de caso são caracterizados pela definição de uma unidade restrita de análise, a qual passa a ser alvo de observação holística, naturalística e exploratória. Além disso, os estudos de caso levam em conta a perspectiva dos autores dos comportamentos analisados e os diferentes significados (às vezes contraditórios) produzidos pelos participantes da situação investigada. Portanto, o estudo de caso é uma abordagem de pesquisa que privilegia o olhar interpretativo e é adaptável aos objetivos da pesquisa.

Concordemente, esse estudo constitui um estudo de caso, visto que se limita a uma unidade de análise, composta de uma comunidade de aprendizes e um professor-pesquisador. O caso investigado é a aplicação de um conjunto de atividades didáticas com ênfase em entonação e as questões decorrentes desse processo durante o período de convivência com o grupo. As atividades foram desenvolvidas pelo professor-pesquisador com base na abordagem teórica de Brazil (1997) para os significados entonacionais. Além disso, as atividades de percepção no laboratório de informática foram desenvolvidas a partir de Chun (2002) e com arquivos de som disponibilizados por Grabe (2001), os quais foram apresentados aos alunos com o programa Praat 4.0.41 (Boërsma, P. e Weenink, D, 2003). Os dados foram coletados através de gravações das atividades em pares em sala de aula e de respostas às atividades de percepção fornecidas por uma folha de respostas (handout) elaborada especialmente para essa atividade. Para elucidar as perspectivas dos participantes da situação investigada, o professor-pesquisador manteve um diário, que foi posteriormente submetido a uma análise temática com base em Attride-Stirling (2001), e os alunos responderam a questionários abertos, que também foram analisados tematicamente.

Resultados e Discussão

Os resultados deste estudo apontam para a possibilidade de desenvolvimento da percepção dos alunos em relação aos fenômenos entonacionais, o que nos permite responder afirmativamente a primeira pergunta de pesquisa. Contudo, constatou-se também que este é um processo que demanda tempo e paciência dos professores, e que, portanto, não deve se restringir a apenas um período do programa de ensino, mas deve, antes, ser integrado com outras atividades que compõem o programa durante todo o período de estudo formal da língua estrangeira.

A segunda e a terceira perguntas de pesquisa foram respondidas a partir da constatação que, dentre as atividades aplicadas, aquelas realizadas no laboratório e que consistiam na percepção e identificação de tons alcançaram considerável êxito, visto que a maior parte das respostas foram corretas. Igualmente, as atividades em pares na sala de aula também alcançaram êxito satisfatório. Visto que este tipo de atividades inclui diversas modalidades, constatou-se que as mais eficazes são aquelas que enfocam um único aspecto entonacional (ex: ‘empregue entonação X para fazer as perguntas’, ‘inicie um tópico com a tonalidade Y’) e que permitem que o restante do diálogo seja desenvolvido pelos próprios alunos. Em relação à quarta pergunta de pesquisa, foi possível concluir também que as posições identitárias assumidas pelos alunos estão relacionadas com sua atitude para com o programa de ensino de entonação e a própria aprendizagem da língua estrangeira. As representações que os aprendizes elaboram de si e de sua competência lingüística os leva a adotar uma noção de desempenho que pode contribuir para uma atitude de maior ou menor aceitação em relação à sua própria produção e a proposta do programa de ensino. Além disso, alunos que já atuam no ensino da língua estrangeira, e que, portanto, assumem tanto a identidade social de aprendiz quanto a de professor adotam uma atitude de aceitação para com o ensino de entonação (e da própria língua inglesa) que se revela uma fonte de grande motivação para o seu engajamento nas atividades desenvolvidas durante o curso. Algo que merece a atenção dos professores e de outros envolvidos com o ensino da língua estrangeira é a constatação de que tais posições identitárias são representações culturais que apresentam como parâmetros as noções de aprendiz competente da língua estrangeira e de bom aluno de Letras, bem como o conceito de falante nativo. Cabe, portanto, indagarmos quais são os efeitos dessas representações sobre os aprendizes e os programas de ensino, além dos efeitos das pesquisas em Lingüística Aplicada sobre as posições identitárias de professores e alunos.

A questão de como os resultados do presente estudo podem orientar a elaboração de programas de ensino com enfoque em entonação pode ser respondida segundo as questões levantadas nos parágrafos anteriores. Assim, programas de ensino de entonação na aula de língua estrangeira pode contribuir consideravelmente para o desenvolvimento da percepção dos aprendizes. Contudo, também é necessário levar em conta as diferentes reações a tais programas, as quais podem variar em um contínuo que parte da resistência e que chega em alguns casos ao deslumbramento diante do que seria uma oportunidade para aprender a pronúncia nativa da língua estrangeira, ao passo que, para alguns alunos, os critérios da inteligibilidade e da comunicação serão plenamente satisfatórios.

Conclusões

Na conclusão desse estudo, argumentamos a favor da inclusão dos aspectos prosódicos, e particularmente da entonação, no ensino de língua estrangeira por duas razões básicas. Em primeiro lugar, tais aspectos da língua têm importante papel na comunicação, de modo que a capacidade de lidar com eles produtiva e perceptivamente diz respeito à competência e possibilidades comunicativas do aprendiz em interações na língua estrangeira. Em segundo lugar, esses aspectos revelam muito da diversidade cultural e lingüística de falantes ‘nativos’ ou ‘não-nativos’. Portanto, ao colocarmos os aprendizes em contato com a diversidade lingüística existente na língua inglesa, embora por vezes ignorada, estaremos dando aos alunos a oportunidade de se conscientizar da diversidade das identidades lingüísticas e culturais dos que se comunicam nesse idioma, proporcionando, assim, o enriquecimento de suas próprias identidades e habilidades comunicativas.

 

Referencias

 

ATTRIDE-STIRLING, J. Thematic networks: an analytic tool for qualitative research In: Qualitative research Vol. 1 (3), p. 385-405, 2001.

BÖERSMA, Paul; WEENINK, David PRAAT 4.0.41 Instituto de Fonética de Amsterdã, 2003. (Disponível em: www.praat.org ).

BRAZIL, D. The communicative value of intonation in English Cambridge: Cambridge University Press, 1997.

CHUN, M. D. Discourse Intonation in L2: from theory and research to practice. Amsterdam/Philadelphia: John Benjamins Publishing Company (Language Learning and Language Teaching), 2002.

GRABE, E. (org.) IViE CORPUS Phonetics Laboratory, University of Oxford; Department of Linguistics, University of Cambridge, 2001. (Disponível em http://www.phon.ox.ac.uk/~esther/ivyweb/).

JOHNSON, D. M. Approaches to research in second language. New York: Longman, 1992.

NUNAN, D. Research methods in language teaching Cambridge: Cambridge University Press, 1992.

SEARLE, J. R. Intencionalidade. Tradução: Julio Fischer e Tomás Rosa Bueno. São Paulo: Martins Fontes, 1995.

TOMASELLO, M. Origens culturais da aquisição do conhecimento humano. Tradução: Claudia Berliner. São Paulo: Martins Fontes, 2003.

VIGOTSKI, L. S. A formação social da mente: o desenvolvimento dos processos psicológicos superiores. 6 ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998.

WOODWARD, K. Identidade e diferença: uma introdução teórica e conceitual. In: SILVA, T. T. (Org.) Identidade e diferença – a perspectiva dos estudos culturais. Petrópolis, RJ: Vozes, 2000.