O texto publicitário como fonte para o estudo intercultural nas aulas de espanhol como língua estrangeira (E/LE).

MARGARIDA ROSA ÁLVARES (margaridaalvares@yahoo.com.br)/PG-UFG

LUCIELENA MENDONÇA DE LIMA (llima@letras.ufg.br)/UFG

Palavras-chave: cultura – ensino/aprendizagem – interculturalidade

Num mundo cada vez mais multicultural a educação assume muitas responsabilidades e a mais recente é a preocupação intercultural, ou seja, um mundo onde tantas culturas convivem faz-se necessária uma educação intercultural e esta propõe:

uma relação que se dá, não abstratamente, mas entre pessoas concretas. Entre sujeitos que decidem construir contextos e processos de aproximação, de conhecimento recíproco e de interação. Relações estas que produzem mudanças em cada indivíduo, favorecendo a consciência de si e reforçando a própria identidade. Sobretudo, promovem mudanças estruturais nas relações entre grupos. Esteriótipos e preconceitos – legitimadores de relações de sujeição ou de exclusão – são questionados, e até mesmo superados, na medida em que sujeitos diferentes se reconhecem a partir de seus contextos, de suas histórias e de suas opções. A perspectiva intercultural de educação, enfim, implica em mudanças profundas na prática educativa (...) (FLEURI, 2000, p.78).

A globalização aproxima povos e com isso aproximam-se também costumes, formas de pensar, de se expressar e a cultura de um povo, de uma nação interage com as culturas do outro e a educação aparece como polo apaziguador nessa interação para evitar um choque cultural.

Cada cultura possui particularidades e a relação de uma cultura com a outra contribui para essa composição, por isso é necessário o estabelecimento de uma linha de comunicação entre as culturas da língua materna (LM) e as culturas da língua estrangeira (LE), no caso, de língua espanhola a sala de aula aparece como ambiente propício para essa interação pacífica.

Com a era tecnológica tempo e espaço adquiriram novos conceitos provocando novas combinações e interligando pessoas de todo o mundo, o que gerou também um processo de descentramento e desterritorialização que provoca uma fusão de identidades culturais tradicionais com as manifestações advindas da globalização.

Atualmente vivemos um processo híbrido e espera-se que o indivíduo seja capaz de movimentar-se em diversos mundos culturais por estar tão exposto a tantas novidades tecnológicas que lhe permitem uma multiplicidade de notícias em tempo real. Essa constante exposição gera um reorganização no conceito de cultura, os referentes tradicionais dão lugar aos novos códigos simbólicos originados de diferentes culturas que são conhecidas através dos mais variados meios de comunicação e essa reorganização pressupõe mudanças na área da educação. O professor de LE deve estar consciente de que língua e cultura são indissociáveis e deve aproveitar essa exposição sofrida pelo aluno para estabelecer a relação intercultural, essa preocupação enquadra-se perfeitamente na perspectiva comunicativa de ensino de línguas.

Se língua e cultura não se separam e as pessoas estão expostas à novas culturas através dos meios de comunicação, o papel do professor consiste em levar essas culturas para a sala de aula aproximando as culturas da LM e da LE e o texto publicitário aparece como fonte para esse trabalho por refletir o pensamento de uma sociedade e conter elementos socioculturais passíveis de observação, interpretação e discussão.

A partir de uma perspectiva pragmática, vendo a língua em seu contexto de uso, e tendo a interculturalidade como objetivo maior, esse trabalho propõe uma aproximação das culturas do Brasil e da Espanha para o melhor desenvolvimento das aulas de espanhol como LE, já que o ensino de uma língua implica na transmissão de valores de determinadas culturas.

Usando o texto publicitário como fonte de informações culturais e partindo de um modelo interativo de leitura proposto por Moita Lopes (1996), serão realizadas atividades de interpretação pragmática como o uso de inferências e reconhecimento de elementos das culturas do outro dentro desse tipo de texto. Para isso serão selecionadas propagandas de algumas das dezessete comunidades autônomas da Espanha, elaboradas por seus respectivos governos, para o estudo dos elementos culturais contidos nas mesmas e para uma comparação com as culturas da LM, no sentido de promover um diálogo entre as duas culturas aumentando a sensibilização para a aceitação e valorização positiva das diferenças existentes.

A interação social é um dos fatores que mais contribui para a negociação e a conseqüente construção de uma identidade, não podendo esquecer que a identidade de um povo pressupõe uma ligação entre o passado e os novos valores e pensamentos de uma sociedade, assim a sala de aula surge como um ambiente de transformação e negociação de significados, um lugar onde culturas diferentes se encontram e se relacionam.

O diálogo intercultural é proposto pela UNESCO e constitui um dos pilares para educação do século XXI:

...a educação deve utilizar duas vias complementares. Num primeiro nível, a descoberta progressiva do outro. Num segundo nível, e ao longo de toda vida, a participação em projetos comuns, que parece ser um método eficaz para evitar ou resolver conflitos latentes. (DELORS, 2003, p.96)

Modificar nossos pontos de vista e estar receptivos para o novo são vantagens dessa proposta, que além de proporcionar uma convivência pacífica, humaniza o processo da globalização e contribui para a diminuição do preconceito, isso sem falar na aprendizagem de elementos culturais da LE que esse diálogo gera.

O objetivo da nossa pesquisa para a dissertação de mestrado é, antes de tudo, apresentar amostras culturais da Espanha com o propósito de fomentar o respeito entre culturas, tendo em vista que, a partir do momento que o ser humano passa a entender e aceitar a cultura do outro sem impor a sua os conflitos causados pela multiculturalidade tendem a desaparecer levando-os a ter uma postura intercultural. Para a realização dessa pesquisa será realizado um estudo de caso qualitativo para tentar responder as seguintes questões: a) Os alunos reconhecem os elementos culturais presentes nas amostras durante a leitura? e b) Quais elementos textuais os ajudam a fazer inferências dos conhecimentos esquemáticos?

A princípio, uma proposta como essa de se entender e dialogar sobre a diversidade cultural pode parecer uma tarefa muito difícil, mas quando se propõe o uso da sala de aula de LE para essa discussão o cumprimento desse objetivo parece bastante acessível, pois o aluno que se dispõe a aprender uma língua geralmente está aberto a conviver com as culturas dessa língua.

Discutir e conhecer a própria cultura e a do outro são imprescindíveis para a formação de uma opinião crítica. Numa sociedade etnocentrista ou, na melhor das hipóteses, relativista faz-se urgente a transformação intercultural. Não aceitar ou não compreender as culturas do outro são marcas do preconceito que devem ser eliminadas e substituídas pelo diálogo intercultural.

Casal (1999) compartilha da opinião exposta anteriormente quando coloca:

El proceso de enseñanza/aprendizaje de lenguas extranjeras no puede limitarse, por tanto, a ser un mero trasvase de habilidades y conocimientos lingüísticos, más o menos sofisticados; ha de suponer, en alguna medida, la transmisión de actitudes y valores de la cultura meta. Habrá que intentar, pues, llevar al aula los modos de ver la realidad, de entenderla y de interpretarla que poseen los hablantes nativos. (CASAL, 1999,p.14)

Esta autora argumenta, ainda, sobre um risco exitente quando estamos em contato com as culturas da LE: o esteriótipo. Normalmente os alunos tendem a categorizar as culturas do outro a partir de conhecimentos limitados e simplistas que são generalizados e o professor deve esforçar-se para que essa imagem seja transformada através do diálogo intercultural.

O artigo sexto da Declaração Universal da UNESCO sobre a Diversidade Cultural propõe uma diversidade cultural acessível a todos através do conhecimento da cultura do outro e uma observação relevante é que todo o processo de ensino/aprendizagem deve ser humanizado, principalmente quando a cultura aparece como foco constante e com uma citação de Nanzhao (2003) encerramos este artigo: "... a educação e a cultura devem ter como última finalidade para o século XXI um desenvolvimento centrado no ser humano." (NANZHAO, 2003, p.258).

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

CASAL, I.I. Comunicación intercultural y enseñanza de lenguas extranjeras: hacia la superación del etnocentrismo. In: Boletín de ASELE. Málaga: ASELE, 1999, p.13 – 23.

DELORS, J. Educação: um tesouro a descobrir. 8 ed. São Paulo: Cortez; Brasília, DF: MEC: UNESCO, 2003.

MOITA LOPES, L.P. Oficina de linguística aplicada: a natureza social e educacional dos processos de ensino/aprendizagem de línguas. São Paulo: Mercado de Letras, 1996.

MONTIEL, E. El nuevo orden simbólico: la diversidad cultural en la era de la globalización. Lit. linguíst, 2003, nº 14, p.61 – 91.

NANZHAO, Z. Interações entre educação e cultura, na óptica do desenvolvimento econômico e humano: uma perspectiva asiática. In: DELORS, J. Educação: um tesouro a descobrir. 8 ed. São Paulo: Cortez; Brasília, DF: MEC: UNESCO, 2003, p. 257 – 267.

SANTOS, J.L. O que é cultura. São Paulo: Brasiliense, 2003.