Título: A VIOLÊNCIA CONJUGAL EM GOIÂNIA NAS DÉCADAS DE 1980/1990.
COSTA, L.B.
SALOMON, M.J.
FCHF
Apresentador: livicosta@hotmail.com
Orientador: marlonsalomon@hotmail.com
Palavras Chaves: Violência, Crime, Paixão e Feminismo.
INTRODUÇÃO
Dentre os diversos fenômenos que se manifestam, atualmente, perante a sociedade brasileira, destaca-se o da violência contra a mulher, localizado em maior amplitude no espaço doméstico, em que a maioria das mulheres são vítimas de seus cônjuges. No decorrer de 14 anos entre 1985 e1999 foram registradas 33.829 ocorrências na Delegacia Especial de Defesa da Mulher, de Goiânia, sendo a maior parte referente à lesão corporal. Segundo as estatísticas da delegacia, a violência intrafamiliar apresenta um índice de 70% dos casos registrados.
Inserida nas relações de gênero, essa violência se constitui como um fato antigo, uma vez que entre suas várias formas de expressão, ela é produzida no interior de relações hierárquicas de gênero construídas historicamente.
Não obstante, pode-se dizer que esse fenômeno se insere entre diversas outras questões, que emergiram a partir da atuação do movimento feminista em luta contra a opressão feminina e da própria produção de estudos voltados para o tema, possibilitando verificar esta violência presente em questões como democracia, direitos humanos e justiça social.
Percebendo a violência contra a mulher como um problema histórico, social, cultural e de grande relevância na região de Goiás, o presente texto, propõe apresentar parte do resultado de uma pesquisa já em andamento, sobre o fenômeno da violência conjugal. O objetivo da pesquisa é investigar a história da violência conjugal em Goiânia a partir das representações construídas acerca desta violência na imprensa escrita goianiense e pelos grupos feministas nas décadas de 1980/1990. A análise destas representações possibilita historicizar a visibilidade e/ou a não visibilidade da violência conjugal na cidade de Goiânia, e a reação do feminismo.
METODOLOGIA:
As principais fontes da pesquisa são os jornais de circulação diária de Goiânia como o Diário da Manhã e O Popular. Esses jornais registraram e debateram os crimes entre cônjuges ocorridos em Goiânia nas décadas de 1980/1990, evidenciando a posição dos grupos feministas e da opinião pública em relação a esses crimes.
O objetivo de pesquisar nessas fontes, não é propriamente definir se os crimes conjugais descritos nos periódicos dos jornais se passaram ou não de maneira como são relatados e sim o de tentar perceber como a violência conjugal foi discutida e interpretada em determinado contexto. É nesse sentido, que a pesquisa analisa os casos de violência conjugal, percebendo quais as representações que os grupos feministas da época, a imprensa, e outras posições como a da opinião pública, registradas pelos jornais, construíam em torno do fenômeno.
A discussão irá ocorrer através da mediação entre o trabalho empírico, e a historiografia sobre o tema. A abordagem dos conceitos em torno da violência conjugal será analisada mediante leituras teóricas que versam sobre a violência em uma perspectiva cultural, considerando a violência conjugal como resultado das relações hierárquicas de gênero, e outras que analisam a violência entre cônjuges inserida em problemas de ordem sócio-econômica.
RESULTADOS E DISCUSSÕES:
Diante das matérias jornalísticas pesquisadas, compreendidas em alguns anos das décadas de 80 e 90, percebe-se uma visibilidade do fenômeno da violência conjugal imerso a uma certa ausência de mudanças em relação às principais justificativas dos agressores, na maioria companheiros, maridos, ex-cônjuges a praticarem violência contra suas parceiras. A impunidade e morosidade dos processos consistiram também como marco presente nos anos pesquisados e nas estatísticas encontradas atualmente.
De janeiro a agosto de 1981, 40 mulheres foram mortas em Goiás e 15 delas, em Goiânia – a maioria assassinada por seus maridos -, e nenhum dos casos foi levado a julgamento até o fim do ano de 1981. Dos 15 casos (ocorridos em Goiânia) registrados entre os meses de janeiro a agosto, com exceção de quatro crimes, todas as justificativas alegadas diziam respeito ao rompimento definitivo do romance, ao excesso de paixão que levou a um ciúme doentio e a própria infidelidade.
Argumentos como "forte emoção", excesso de amor, ciúmes e paixão eram as principais alegações dos casos de violência conjugal de Goiânia nas décadas de 80 e 90 dando visibilidade a esses casos como "crimes da paixão". Esses argumentos também corresponderam a alguns crimes entre cônjuges ocorridos nas décadas de 60 e 70, e que foram registrados pelos jornais já pesquisados. Parte dos grupos feministas da época, algumas posições da opinião pública , registrada pelos jornais, também relacionavam os casos de violência conjugal como os crimes da paixão.
As justificativas geralmente permaneciam as mesmas, porém, os crimes que envolveram agressores pertencentes às camadas altas da sociedade eram retratados como patológicos, além dos julgamentos terem sido sempre adiados. Em algumas matérias jornalísticas da década de 80, encontrei slogans como: "Assassinos ricos necessitam de tratamento médico"; em contraponto, os agressores pertencentes às camadas baixas da sociedade eram vistos como aqueles que praticavam o crime propositalmente, na maioria das vezes, motivado pelo álcool.
O outro aspecto interessante é a diferenciação com que o jornal retrata os crimes passionais na década de 90 em relação aos de 80. Percebe-se que os textos jornalísticos a partir de 90 visibilizam a violência ligada aos bairros pobres de Goiânia e referentes apenas a cônjuges com baixas condições sócio-econômicas, tendo como motivação o desemprego e o estado de pobreza as principais justificativas à violência. Porém, em diversas reportagens do início dos anos 80, já pesquisadas revelam a posição de vários delegados (as) da época afirmando que os casos pertencentes às mulheres de alta posição social não chegavam ao conhecimento da polícia por serem abafados pelas próprias vítimas.
Em relação ao discurso das feministas acerca da violência conjugal, percebe-se uma ênfase, da parte dos primeiros grupos feministas, em representar a opressão sobre as mulheres como resultado das relações hierárquicas entre os sexos construídas historicamente. Não obstante, outras posições registradas pelos jornais representavam a violência conjugal decorrente de problemas como a pobreza, o desemprego e a própria bebida que leva o agressor agredir sua companheira.
Assim, diante do que foi pesquisado até o momento, evidencia-se que a história dos crimes ocorridos nas décadas de 1980/1990 traz aspectos que levam a pensar nas diferentes representações que se fazem do fenômeno da violência conjugal. Um dos propósitos a ser seguido constitui em tentar perceber qual a historicidade dessa violência entre cônjuges, em Goiânia, e sua construção sócio-cultural.
CONCLUSÕES
Diante das questões já levantadas, percebe-se que as justificativas alegadas pelos agressores na relação conjugal violenta permaneceram as mesmas nos anos pesquisados. O amor, o ciúmes, o adultério e a legítima defesa da honra foram às noções que deram visibilidade ao fenômeno da violência conjugal na sociedade goianiense no contexto pesquisado. O objetivo agora é tentar historicizar essas noções como o amor, a honra, o adultério que fizeram parte do debate das feministas e da própria imprensa no que concerne a relação conjugal violenta.
BIBLIOGRAFIA
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