A EXPLORAÇÃO, O ABUSO E A AGRESSÃO SEXUAL CONTRA A CRIANÇA E DO ADOLESCENTE ANALISADA À LUZ DA VITIMOLOGIA

 

 

 

Débora de Oliveira Lara Rassi

Universidade Federal de Goiás

Deboralara.jur@ucg.br

Palavras chaves: vitimologia - abuso – sexual - menores

 

 

APRESENTAÇÃO

O presente projeto tem como pano de fundo o estudo da vitimologia, a par do qual se desenvolverá com especificidade pesquisa acerca da questão da exploração, do abuso e da agressão sexual contra a criança e do adolescente.

Em sua origem, desde a escola Clássica impulsionada por Beccaria e Feuerbach à escola Eclética de Impalomeni e Alimena, passando antes pela escola positivista de Lombroso e Garofalo (1997), o Direito Penal praticamente teve como meta a tríade delito-delinquente-pena. O outro componente do contexto criminal, a vítima, não foi, até então, levado em consideração. Isto apenas passou a ocorrer quando outras ciências, principalmente a criminologia, tiveram que vir em auxílio do direito penal para análise aprofundada do crime, do criminoso e da pena.

Carrara apud Neves, a este respeito, já afirmara que o direito penal era o direito dos criminosos, pois a vítima estava relegada ao segundo plano.

Posterior à criminologia, conforme posicionamento de parte da doutrina, sobreveio a vitimologia, cujo estudo é relativamente novo, pois, historicamente, surgiu com a evolução social e notoriamente com os massacres perpetuados na 2ª Guerra Mundial, com o holocausto judeu ocorrido nos campos de concentração comandados por Adolfo Hitler.

A Vitimologia teve origem na necessidade de estudo, assistência e proteção à vítima de crime, posteriormente evoluiu para a questão da vitimodogmática onde se vislumbrou a possibilidade de ser esta a responsável isoladamente ou co-responsável com o autor do crime pelo resultado criminoso em causa. Atualmente, o campo dos direitos humanos acena para uma ‘nova’ vitimologia, oferecendo uma concepção mais ampla do tema, propondo o estudo das fontes de vitimização como as condições adversas: econômicas, sociais, políticas, dentre outras ensejadoras da vitimização. O estudo histórico é salutar à confecção da obra proposta, vez que as vítimas a serem estudas deverão ser analisadas sobre estes prismas.

Sobre o fundador da doutrina da vítima ou vitimologia não há consenso doutrinário a seu respeito, sendo de se destacar a posição de Paasch para o qual o estudo sistemático da doutrina somente começou com Benjamin Mendelsohn, advogado em Jerusalém, cujos trabalhos datam de 1945. Para Jiménez de Asúa (1985), Willy Calemart H. Ellenberger e Hans Von Heting (1990) teriam antecedido a B. Mendelsohn Oliveira (2003;8). Wolfgang, Hans Gross e Luigi Pirandello, dentre outros, também são apontados como precursores aos autores indicados por Paasch. Deixaremos, entretanto, a análise deste tema quando da confecção da dissertação que dá mote a obra.

Outro aspecto polêmico a ser tratado sobre a vitimologia, consoante ao acima exposto, concentra-se na discussão acerca da posição da doutrina da vítima, porquanto, para alguns doutrinadores o tema deve ser erigido à categoria de ciência, como é o caso dos pensamentos de Mendelsohn e seus discípulos, pois a vitimologia ocupa-se do estudo da vítima enquanto que a criminologia ocupa-se do estudo do criminoso. Por outro lado, há os opositores que defendem-na como simples capítulo da criminologia, a exemplo de Jiménez Asúa, Souchet, Paasch, dentre outros, para estes a criminologia não se ocupa simplesmente com o autor da infração, mas, sobretudo do ato delituosos e de seu nascimento, inexistindo razão para tornar independente e justificar uma noção especial da vitimologia.

Quanto ao conceito definitivo de vitimologia, ainda é cedo para emiti-lo, bem assim, para traçar-lhe limite e contorno, entretanto, pode-se dizer que vitimologia é o estudo da vítima no que se refere à sua personalidade, quer do ponto de vista biológico, psicológico e social, quer o de sua proteção social e jurídica, bem como das fontes, meios e efeitos de vitimização, sua inter-relação com o vitimizador e aspectos interdisciplinares e comparativos. É, também, sob estes parâmetros que se pretende glosar a pesquisa.

À vista do acima exposto, é possível acrescentar, que a vitimologia aspira fazer com que a justiça não conheça somente o criminoso e o destaque, elevando-o ao grau de fator principalíssimo, mas que tenha em consideração também o papel que representa a vítima. A este fenômeno anti-social é dado o nome de couple-pénal, pareja-penal, victim-precipitated ou dupla-penal porque se unem duas pessoas para a prática de um crime. Neste contexto, há de se avaliar a existência ou não e o alcance da contribuição das vítimas para os resultados delituosos dos crimes sexuais que se estudará.

Do estudo da vitimologia decorre o fenômeno da vitimização, que é a ação ou efeito de alguém ou grupo de pessoas de vitimarem outras pessoas (causar qualquer tipo de dano, sofrimento ou padecimento), como ocorre com a vitimização pela exploração da tenra idade, pela desigualdade sexual e social, pelas próprias autoridades incumbidas da defesa dos menores, pela conduta omissiva da família, pela possível contribuição da mídia, da comunidade etc. O estudo deste fenômeno é salutar para o desenvolvimento da pesquisa na medida em que propiciará o levantamento das características do vitimizador ou vitimizadores e apuração da responsabilidade familiar, social e governamental.

Vítima, em termos gerais, tanto pode ser um indivíduo como a sociedade.

Adita-se que o estudo da vitimologia interessa não só à criminologia, pois que possui campo multidisciplinar, com todos os ramos das ciências sociais, como o Direito Civil, com os danos morais, lesões às vítimas e até a morte pelo ato ilícito; o Direito Administrativo, com a responsabilidade dos órgãos estatais e paraestatais; o Direito Constitucional, com suas normas sobre a responsabilidade e o amparo social, a garantia dos direitos humanos, bem assim, pela supremacia da proteção da criança e adolescente; com o Direito Penal, pois que o comportamento da vítima, notadamente do adolescente, poderá influenciar na existência ou não do crime, como na questão do consentimento da vítima, da dosagem da pena, na extinção de punibilidade, na possibilidade ou não de se considerar a presunção de violência quando o crime for praticado contra menor de quatorze anos, dentre outras influências penais que serão abordadas oportunamente.

No plano da Política Criminal, a vitimologia contribui para a formulação de normas penais, como é o caso da proposta de emenda à Constituição (PEC 276/04), do deputado paraense Nilson Pinto (PSDB), que inclui no rol dos crimes inafiançáveis e imprescritíveis a exploração e o abuso sexual de criança e adolescente. No Direito Formal, onde se vislumbra a necessidade de alterar o Código Processo Penal no sentido de impor à autoridade policial o dever de apurar fatos sobre a personalidade da vítima e as conseqüências imediatas do ato delituoso, pois que tais diligências não estão previstas no art. 6º, do Código Processual Penal.

No Brasil, a fonte direta e mais abundante de estudo da vítima está na Constituição Federal, no Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/90), no Código Penal, na Lei dos Crimes Hediondos (8.072/90) e na Lei 9.455/97, que define os Crimes de Tortura.

Insta acentuar a Lei 7.210/84, que em seu artigo 29, §2º, estabelece que o produto da remuneração pelo trabalho do preso deverá, entre outras coisas, atender aos danos causados pelo crime.

No Direito Civil, contrariamente ao Direito Penal, o problema da proteção da vitimologia tem solução relativamente eficaz, pois que se o autor do ato lesivo obrou com culpa exclusiva, a vítima, ou seus sucessores e prejudicados, serão completamente indenizados. Mas, se a culpa é concorrente entre o autor do ato ilícito e o ofendido, este e seus beneficiários receberão ressarcimento proporcional ao grau de culpa de cada um.

No plano mundial, não se pode deixar de fazer referência à pedofilia praticada através da internet, cujo tema, por ser denso é merecedor de outra pesquisa, entretanto, será amenamente apreciado no contexto deste estudo. Contribuições da Unesco, da Declaração Universal dos Direitos Humanos, da Convenção Sobre Direitos da Criança, da ONU, de 1989, regulamentada no Brasil pelo Decreto 99.710/90, serão apreciados no caso em tela.

No curso da pesquisa pretende-se, também, estudar os danos psicológicos causados à criança e ao adolescente em razão da exploração e do abuso sexual. Insta acentuar, já neste momento, conforme Göckel (1997; 53), que as vítimas de abuso sexual, seja esta de cunho comercial ou não, poderão passar por depressão paralisante, crises de inquietação, medos e receios que toda espécie de coisas ruins possam acontecer, profunda solidão, o sentimento de estarem sujas, o sentimento de não merecerem nada de bom, tensões físicas, tensão temporal-mandibular e tensão nos ombros. Elas se sabotam e ferem a si mesmas, no afã de se castigar, podendo chegar até a morte por sua causa. Para Kernberg apud Sica (2003;111), os instintos agressivos vem do acúmulo de experiências negativas. O estudo de danos como estes e a necessidade de proteção adequada às vítimas por si justificam a pesquisa.

As conseqüências da exploração e do abusos sexual contra a criança e o adolescente resulta em outras conseqüências, como a deturpação da personalidade, voltando as mesmas, não raras vezes, para cometimento de crimes, como comumente verifica-se entre os serial-killer, à vadiagem, propicia o desvio das vítimas das escolas, das famílias e de convivência social saudável, enfim, em graves conseqüências não só físicas, psicológicas, como também, intelectual, moral e social.

Neste momento é oportuno parafrasear a expressão do insigne penalista pátrio Nelson Hungria apud Fernandes (2002;496) e dizer que a rua é o vazadouro de todas as impurezas e a feira do todas as indecências.

Concluindo, o presente projeto pretende abordar com profundidade o tema que dá mote obra, almeja ser este um mero esboço do que se pretende como pesquisa científica acerca da exploração laboral e abuso sexual da criança e do adolescente à luz do fenômeno denominado vitimologia. Todos os enfoques acima, desde o aspecto histórico, social, político, dogmático, psicológico até a legislação pátria e comparada, serão objetos de intensa diligência e profícuo estudo.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

DISCUSSÃO

Qual a posição da exploração, da agressão e do abuso sexual da criança e do adolescente no contexto vitimológico e jurídico no Brasil?

Quais são os dados catalogados em Goiânia a respeito da exploração e do abuso sexual contra de criança e de adolescentes.

Que relação é possível estabelecer entre a figura do agente explorador, abusador ou agressor sexual de menor como tendo sido um dia vítima de crimes semelhantes – efeito espelho.

 

METODOLOGIA

O estudo exigirá um trato metodológico eclético, como se observará a seguir:

a) Dedutivo – bibliográfico, sempre que se cotejarem institutos, normas e formas desses direitos e sua respectiva eficácia. Utilizar-se-á de teorias já existentes, comparando-as e tendo o critério a coerência, a consistência e a não contradição;

b) A pesquisa pretende adotar como processo metodológico, a dogmática jurídica, baseando-se na legislação penal, doutrina, jurisprudência, nos Simpósios sobre Vitimologia realizados no Brasil e fora deste, na Constituição Federal.

c) Abordagens multidisciplinares – pretende-se dialogar com outras ciências, na medida em que as ciências, especialmente da área da saúde, tenham relação com o projeto.

d) Processo histórico – visando a interpretação de acontecimentos do passado com o propósito de descobrir generalizações que possam ser úteis para a investigação do presente estágio da exploração e do abuso sexual à luz da vitimologia;

e) Aplicar-se-á o processo metodológico comparativo, sempre que se cotejarem institutos, formas desses direitos e, respectivas eficácias, tratando-se da prática do Direito Comparado em seus vários aspectos;

f) levantamentos estatísticos.

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FONTE DE FINANCIAMENTO: Não há.