1. TÍTULO: Do brilho das estrelas às virtudes das pedras: a iconografia do Lapidario de Alfonso X de Castela (Séc. XIII).

2.- AUTORES: Dianina Raquel Silva Rabelo.

Orientadora: Dra. Dulce Oliveira Amarante dos Santos.

3.- UNIDADE ACADÊMICA: Programa de Pós-Graduação em História - Faculdade de Ciências Humanas e Filosofia

4.- E-mail: dianina@bol.com.br dulce@fchf.ufg.br

5.- PALAVRAS-CHAVES: Imagem, magia, astrologia, astronomia.

  1. INTRODUÇÃO:

Este trabalho é uma parte da pesquisa que está em andamento no mestrado. Assim, o aspecto que analisaremos aqui é a iconografia do Primeiro Tratado do Lapidario, a qual representa um conjunto artístico e cultural que merece atenção. O propósito deste trabalho é analisar todas as imagens, porém, este objetivo não está totalmente contemplado, bem como os aspectos a serem abordados na análise, como, por exemplo, o estudo das cores, que ainda não foi possível realizar, e outros. Segundo Dominguez Rodriguez (1984), a miniatura alfonsina constitui um dos grandes momentos da pintura espanhola e um dos conjuntos de maior coerência ideológica e cultural. A metodologia utilizada é o diálogo com historiadores e historiadores da arte que se dedicaram ao estudo de imagens e ao estudo do Lapidario.

O Lapidario de Alfonso X possui um caráter singular, pois é uma obra cortesã (centrada na pessoa do monarca), científica e de cunho astrológico. O estudo de sua iconografia restringe ao Primeiro Tratado.

  1. MATERIAL E MÉTODOS:
  2. A fonte utilizada nesta pesquisa é uma edição impressa referente ao manuscrito Lapidario. Temos também obras publicadas sobre o manuscrito, as quais possuem diversas imagens do manuscrito.

    A pesquisa desenvolve-se através do diálogo com a historiografia que se ocupa com a problemática da magia, astrologia e astronomia, e com a iconografia do Lapidário e de outras obras afonsinas; também desenvolve através da análise das imagens presentes no manuscrito e, por fim, com a análise da relação entre a narrativa e a iconografia do Lapidário.

    III- RESULTADOS E DISCUSSÕES

    No conjunto iconográfico desta obra temos: a imagem de retrato do autor; a imagem da cena de apresentação; as miniaturas, que estão divididas em três grupos: as miniaturas das iniciais de cada introdução de cada capítulo, as miniaturas das iniciais que representam a busca e descoberta das pedras, e as miniaturas das constelações representadas em medalhões e rodas; as marginais que constituem prolongações das letras iniciais e das colunas do texto; e os cabeçalhos.

    As duas primeiras miniaturas aparecem no primeiro fólio do manuscrito. Ocupando toda a parte alta da primeira coluna, no primeiro fólio, está a imagem de retrato do autor. Nela, aparece um velho barbudo sentado solenemente em uma cadeira, em gesto de explicar para dezesseis anciãos. Este mesmo velho segura um livro com uma mão e aponta o dedo indicador da outra mão para o grupo de anciãos, os quais, sentados no chão, o escutam atentamente. Todos estes homens possuem aspecto oriental: gorros agudos, narizes compridos e finos, e barbas. E todos eles aparecem sob as arcadas abertas de um edifício gótico.

    A segunda imagem que ilustra o Prólogo é a da cena de apresentação. Esta é pequena em relação à primeira, e está miniada e iluminada na inicial A, onde começa o livro. Nela temos a figura de um rei coroado, sem barba, sentado (sem que se veja o assento) com um livro sobre os joelhos e com atitude de ditar aos escribas, também sentados e que parecem estar à sua volta. Nesta imagem não resta dúvida que o rei coroado é Alfonso X, uma vez que este tipo de imagem é comum nas obras alfonsinas, principalmente nas Cantigas de Santa Maria. Esta atitude revela a função do rei como o autor da obra, porém se não a escreveu por completo, pelo menos dita os prólogos aos escribas que as traduziu e compilou. Segundo Dominguez Rodriguez (1984), os dois personagens que aparecem à sua volta podem ser Yhuda Mosca e Gari Pérez, pois como o Lapidario não é uma obra escrita por Alfonso X, mas somente de sua autoria, e, como sabemos, os tradutores deste Tratado são os mencionados acima, a imagem pode representar a cena de entrega ou apresentação do códice pelo copista ao monarca. Entretanto, as vestimentas não nos permitem tal afirmação, somente essa de entrega do códice.

    Depois do Prólogo e das imagens que os ilustram, temos, no Lapidario, os doze capítulos dedicados cada um a um signo do Zodíaco. Todo capítulo possui uma pequena introdução com a inicial miniada e iluminada, porém não podemos realizar a análise dessas inicias, uma vez que o livro impresso perde todas essas introduções. Em cada um desses capítulos aparecem sessenta miniaturas: trinta delas são dedicadas à apresentação de cada uma das pedras que aparecem, sucessivamente, nos graus zodiacais; as outras trinta miniaturas são dedicadas às constelações que determinam as virtudes das pedras. Essas miniaturas aparecem, em cada capítulo, ao longo do Primeiro Tratado do Lapidario.

    As miniaturas que representam cenas de busca e descoberta das mesmas possuem caráter decorativo e aparecem, sucessivamente, nas letras iniciais de cada pedra, as quais por sua vez, são sempre a letra D, uma vez que em todo o tratado as descrições das pedras começam da seguinte forma: "De la piedra ...". Essas iniciais são do tipo historiadas e, como foi mencionado, com histórias de obtenção e descoberta das pedras. É admirável o esforço dedicado em dar variedade a estas ilustrações. Geralmente as cenas se dão no mar ou em cavernas, onde o lugar específico nestes locais, os tipos, a indumentária, as atitudes são sempre distintas, e aparecem duas pessoas. Podemos perceber também o esforço de ajustar-se ao texto fielmente, o que não acontece com alguns bestiários: se nele está mencionada uma catarata, há uma catarata na miniatura.

    Ao final de cada descrição de cada pedra há sempre um parágrafo destinado a citar a estrela cuja posição influencia nas virtudes da pedra descrita. Para ilustrar estes parágrafos há, depois de cada um, a miniatura que representa a correspondente constelação, com a estrela na posição assinalada pelo texto, a qual determinam as virtudes das pedras. Essas miniaturas são representadas em medalhões, e correspondem às constelações (setentrionais, zodiacais e meridionais). As constelações zodiacais são as mais nobres, maiores e mais virtuosas, devido à sua posição no Zodíaco, ou seja, no lugar percorrido pelo Sol durante todo o ano. Essas constelações aparecem duplamente no tratado – nos medalhões e nas rodas -, talvez devido à importância, pois, como foi mencionado, são as constelações mais nobres.

    As rodas do Primeiro Tratado aparecem no final de cada um dos doze capítulos em que se divide o texto. Assim, cada roda aparece sendo regida por um dos doze signos do Zodíaco. São grandes ilustrações, as quais ocupa, cada uma, um fólio inteiro. E contém trinta campos que correspondem aos trinta graus que cada signo se divide. Nos campos de cada roda, em torno do signo do Zodíaco correspondente, se encontram duas séries de personagens: numa série estão as trinta constelações que exercem virtudes nas pedras, respectivamente; na outra série estão trinta anjos, todos iguais, sentados em atitude frontal e sob arcadas góticas. Segundo Dominguez Rodriguez (1984), este tipo de imagem – grandes círculos que ocupam todo um fólio e que se distribuem em campos radiais em torno de um medalhão central - é característico dos manuscritos alfonsinos.

    Há dois aspectos a ressaltar em relação a este tipo de miniatura: a presença de algumas rodas pintadas com fundo azul, e de figuras de anjos, todas iguais. Talvez há aqui um propósito em ilustrar a idéia que é mencionada no Prólogo, segundo a qual todas as coisas que estão sob os céus se movem e se endereçam pelo movimento dos corpos celestiais, pela virtude que tem deles, segundo a ordem de Deus, como foi citado em outra ocasião.

    As decorações marginais, de caráter somente decorativo, constituem prolongações das letras maiúsculas e estendem-se pelas margens das colunas do texto, como ramas vegetais. Este tipo de decoração, denominado "marginalia" devido à localização nas margens fora das colunas do texto, possui um caráter singular: não constitui apenas de elementos vegetais, mas se metamorfoseia ora com figuras de animais ora com figuras humanas, ou ainda com figuras sobrenaturais, como, por exemplo, monstros. Isso nos permite identificar elementos fantásticos em tal decoração. Porém, tais elementos não retiram a beleza e a qualidade da ornamentação.

    É importante ressaltar que no período de passagem da arte românica para a arte gótica, as miniaturas invadem as margens do texto. Assim, este tipo de ornamentação – as marginalia – formam uma espécie de quadro, cercando o texto em forma de janela.

    Por último temos a decoração dos cabeçalhos. Os fólios possuem na parte superior a indicação do signo do Zodíaco correspondente a seu texto. Algumas vezes o cabeçalho se reparte entre as partes par e ímpar. Em outras, cada página possui seu título.

    Podemos perceber no Lapidario uma preocupação estética não só com a iconografia, mas em todo o conjunto da obra, na qual o texto não se sobrepõe às imagens nem as imagens se sobrepõem ao texto. Temos, assim, o "efeito da dupla página como conjunto", onde o texto, aberto o livro, se divide em quatro colunas e o título, como foi mencionado acima, aparece na dupla página unificando-a. E cada pedra se individualiza por meio de duas formas: o título da pedra em vermelho, destacando-a do texto escrito em preto; e pelas duas miniaturas que as acompanham - a da inicial e a constelação da qual depende sua virtude. Segundo Dominguez Rodriguez (1984), o resultado da dupla página é comparável a uma composição arquitetônica de uma grande fortaleza e equilíbrio, devido à harmonia entre o macrocosmos e o microcosmos e, portanto, um dos aspectos de grande êxito do Lapidario. Isto também acontece em outros manuscritos medievais.

  3. CONCLUSÕES

1. O Lapidario alfonsino constitui um exemplo singular entre os manuscritos medievais, devido à confluência, como foi mencionado acima, da magia e da astrologia, e, mais ainda, da arte. Podemos perceber, por meio do conteúdo, do luxo, do esbanjamento e da iconografia, que este manuscrito faz parte de um programa cortesão, para o qual muito esforço, de todo tipo, foi dedicado. E o principal foi o esforço econômico. Assim, como em toda obra cortesã, no Lapidario há uma nítida exaltação à figura do soberano (neste caso Alfonso X).

2. Com a análise da narrativa do Lapidario e com a análise, embora parcial, da iconografia do Primeiro Tratado, já identificamos um sincretismo cultural, principalmente nos personagens e ambientes das miniaturas. Identificamos também uma rica criatividade imaginativa, por meio da qual os pintores do ateliê alfonsino criaram não somente figuras da nossa realidade material, mas também todo um conjunto de criaturas fantásticas, as quais contribuíram em grande medida para a beleza e a ornamentação do manuscrito.

V- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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DOMINGUEZ RODRIGUEZ, Ana. Poder, ciencia y religiosidad en la miniatura de Alfonso X El Sabio. Una aproximación. IN: Fragmentos. 2 (33-46). Madrid, 1984.

EVANS, Joan. Magical jewels of lhe Midle Ages and the Renissance particulary in the England. Oxford: Clarendon Press, 1922.

FRIAÇA, Amâncio. A unidade do saber nos céus da Astronomia medieval. In: Trivium & Quadrivium. As artes liberais na Idade Média. Cótia (SP): Íbis, 1999. P. 291-329.GARCÍA AVILÉS, Alejandro. Alfonso X y la tradición de la magia astral. In: MONTOYA MARTÍNEZ, Jesus e DOMINGUEZ RODRIGUEZ, Ana (Cordenadores). El Scriptorium: De los libros de Astrología a las "Cantigas de Santa Maria". Madri: Editora Complutense, 1999. P. 83-103.

V-FONTE DE FINANCIAMENTO: CNPQ.