CARACTERIZAÇÃO DE Cryptococcus neoformans ISOLADOS DE FONTES AMBIENTAIS URBANAS NA CIDADE DE GOIÃNIA, ESTADO DE GOIÁS, BRASIL.
KOBAYASHI, C. C. B. A1.; SOUZA, L. K. H1.; SOUSA, E. D2; SILVA, A. C1.; BRITO, S. C. A1.; FERNANDES, O. F. L1.; SILVA, M. R. R1.
1
Instituto de Patologia Tropical e Saúde Pública da Universidade Federal de Goiás, Goiânia, Brasil.2
Hospital de Urgências de Goiânia, Goiás, Brasil.Introdução: Cryptococcus neoformans é um fungo, geralmente oportunista, que causa meningoencefalite como a manifestação clínica mais frequente em indivíduos com imunodeficiência celular, principalmente em pacientes com AIDS (LACAZ et al., 2002). Este microrganismo é classificado em cinco sorotipos (A, B, C, D e AD), sendo o sorotipo A responsável pela maioria dos casos em pacientes imunocomprometidos (BARRETO DE OLIVEIRA et al., 2004). Esta espécie é uma levedura encapsulada com alta prevalência no meio ambiente e comumente encontrada em solo enriquecido com excretas de aves e em materiais de plantas (MONTENEGRO & PAULA, 2000; FILIÚ et al., 2002). Infecções devido a C. neoformans são freqüentemente tratadas com anfotericina B e/ou fluconazol, sendo este último agente antifúngico amplamente usado para terapia de manutenção, particularmente, em pacientes com AIDS e associado com o desenvolvimento de isolados de C. neoformans menos suscetíveis (BRANDT et al., 2001). A associação da infecção criptocócica humana com a via de inalação de partículas infecciosas de fontes saprofíticas e a alta ocorrência de criptococose em pacientes com AIDS, em Goiânia, justificam o estudo dos habitats desta levedura como prováveis fontes de criptococose nesta cidade.
Objetivos: Investigar a presença de espécies de Cryptococcus e caracterizar os isolados de C. neoformans provenientes de fontes ambientais urbanas na cidade de Goiânia, Goiás, Brasil.
Material e Métodos: Um total de 290 amostras, incluindo 177 de excretas de pombos e 44 de aves de aviculturas, 12 de solo sem acúmulo desses excrementos, 22 ocos de árvores ornamentais e 35 materiais vegetais associados a Eucalyptus foram colhidas em 35 diferentes locais, durante o período de um ano (2002-2003), na cidade de Goiânia, Goiás, para estudar as fontes ambientais das espécies de Cryptococcus. O ágar seletivo semente de Guizotia abyssinica foi utilizado para o isolamento primário de C. neoformans. Os isolados foram identificados como Cryptococcus através de técnicas micológicas padronizadas (KURTZMAN & FELL, 1998), baseadas nas características macroscópicas e microscópicas das colônias e na assimilação de carboidratos e de compostos nitrogenados. Fatores de virulência, características importantes de identificação, como produção de fenoloxidase e de cápsula, habilidade de crescimento a 37º C e de síntese de urease, foram pesquisados. Todos os isolados de C. neoformans foram submetidos a quimiotipagem e a sorotipagem utilizando-se o meio de L-canavanina glicina azul de bromotimol e o teste de aglutinação com fatores anti-soro específicos (kit Crypto Check Iatron), respectivamente. A suscetibilidade antifúngica in vitro dos isolados de C. neoformans para fluconazol, itraconazol e anfotericina B foi investigada usando o método de microdiluição em caldo, de acordo com NCCLS (2002).
Resultados e Discussão: Das 290 amostras colhidas, 41 isolados de C. neoformans foram obtidos de excretas de pombos, nas quais o fungo foi isolado em 20,3% (36/177) e de materiais vegetais de árvores de Eucalyptus, nos quais C. neoformans foi identificado em 14,3% (5/35). Todos os isolados ambientais de C. neoformans pertenceram a C. neoformans var. grubii (sorotipo A). C. neoformans var. gattii não foi isolado em nenhuma amostra examinada, apesar de casos de criptococose por essa variedade ocorrerem em Goiânia (FERNANDES et al., 2003). Com relação às amostras de excretas de pombos, C. neoformans var. grubii foi isolado em materiais fecais obtidos em locais próximos a um grande fluxo de pessoas, sugerindo alta exposição da população para esse fungo. 35% das amostras positivas para esta espécie estavam situadas em locais protegidos da radiação solar, sendo que as igrejas, onde foi verificado maior acúmulo de fezes dessecadas, apresentaram alta contaminação (41,5%). Isto pode ser explicado pela alta resistência de C. neoformans a dessecação, o que favorece a sua sobrevivência ao competir com outras populações de microrganismos, contribuindo para a sua contaminação no ambiente urbano (KWONG-CHUNG & BENNETT, 1992). C. neoformans var. grubii também foi isolado em amostras de cascas de eucaliptos, materiais relatados como possíveis habitats vegetais dessa variedade (NISHIKAWA et al., 2003). Cryptococcus não neoformans foram isolados em 90 (68,7%) das 131 amostras ambientais positivas para o gênero Cryptococcus, sendo as seguintes espécies identificadas: C. albidus (47,3%), C. laurentii (8,4%), C. uniguttulatus (7,6%), C. gastricus (2,3%), C. luteolus (2,3%) e C. terreus (0,8%). O isolamento dessas espécies apresenta grande importância, uma vez que têm sido relatadas como agentes de infeções oportunísticas, principalmente em pacientes imunocomprometidos (KUNOVA & KREMERY, 1999). No teste de suscetibilidade antifúngica, todos os isolados de C. neoformans apresentaram valores de CIM baixos e, portanto, nenhum mostrou resistência in vitro a fluconazol, anfotericina B e itraconazol, dado consistente com a literatura, na qual a maioria dos isolados de C. neoformans é sensível a estes agentes antifúngicos (CHANG et al., 2004).
Conclusões: O presente estudo mostrou a presença de C. neoformans isolados de fontes ambientais urbanas em locais com grande circulação pública, em Goiânia. A freqüente exposição da população às leveduras dessecadas ou aos basidiósporos presentes nestes reservatórios, fontes de infecção criptocócica, ressalta a importância da elucidação da ecologia dessa espécie.
Referências bibliográficas:
BARRETO DE OLIVEIRA, M. T. et al. Cryptococcus neoformans Shows a Remarkable Genotypic Diversity in Brazil. J. Clin. Microbiol., v. 42, p. 1356-1359, 2004.
BRANDT, M. E. et al. Trends in Antifungal Drug Susceptibility of Cryptococcus neoformans Isolates in the United States: 1992 to 1994 and 1996 to 1998. Antimicrob. Agents Chemother., v. 45, p. 3065-3069, 2001.
CHANG, W.N. et al. Serotypes of Clinical Cerebrospinal Fluid Cryptococcus neoformans Isolates from Southern Taiwan and Their In Vitro Susceptibilities to Amphotericin B, Fluconazole, and Voriconazole. Jpn. J. Infect. Dis. , v. 57, p. 113-115, 2004.
FERNANDES, O. F. L. et al. In vitro susceptibility Characteristics of Cryptococcus neoformans varieties from AIDS Patients in Goiânia, Brazil. Mem. Inst. Oswaldo Cruz, v. 98, p. 839-841, 2003.
FILIÚ, W. F. O. et al. Cativeiro de aves como fonte de Cryptococcus neoformans na cidade de Campo Grande, Mato Grosso do Sul, Brasil. Rev. Soc. bras. Med. trop., v. 35, p. 591-595, 2002.
KUNOVA, A; KREMERY, V. Fungaemia due to thermophilic cryptococci: 3 cases of Cryptococcus laurentii bloodstream infections in cancer patients receiving antifungals. Scand. J. Infect. Dis., v. 31, p. 328, 1999.
KURTZMAN, CP; FELL, JW. The yeasts, a taxonomic study. 4th ed., Elsevier, Amsterdam, 1998, pp. 1-1055.
KWONG-CHUNG, K.J.; BENNETT, J.E. - Cryptococcosis, In: Kwong-Chung KJ, Bennett, JE, eds. Med Mycol, 1st ed. Philadelphia: Lea & Febiger, 1992, p. 397-446.
LACAZ, C. S. et al. Tratado de Micologia Médica, 2002, 9ª ed. São Paulo, Sarvier.
MONTENEGRO, H.; PAULA, C. R. Environmental isolation of Cryptococcus neoformans var. gattii and C. neoformans var. neoformans in the city of São Paulo, Brazil. Med. Mycol., v. 38, p. 385-390, 2000.
NATIONAL COMMITTEE FOR CLINICAL LABORATORY STANDARDS. Reference method for broth dilution antifungal susceptibility testint of yeast. Approved standard. Document M27-A2. Wayne (PA): The Commitee, 2002.
NISHIKAWA, M. M. et al. Serotyping of 467 Cryptococcus neoformans isolates from clinical and environmental sources in Brazil: analysis of host and regional patterns. J. Clin. Microbiol., v. 41, p. 73-77, 2003.