ESTUDO DA EXPRESSÃO DA CASPASE-3 COMO UM MARCADOR DE APOPTOSE NA MIOCARDITE EXPERIMENTAL EM CÃES (RESULTADOS PRELIMINARES)

MENEZES, L. B.; OLIVEIRA, K. S.; DAMASCENO, A. D.; FIORAVANTI, M. C. S., ALVES, R. O.; PAULO, N. M., MARQUES, A. E.; ARAÚJO, E. G.

Escola de Veterinária – UFG

Mestranda: lbm03@hotmail.com

Orientador: esmaraujo@brturbo.com.br

Palavras-chave: apoptose, caspase-3, cão, doença de Chagas.

INTRODUÇÃO

A doença de Chagas é a causa mais freqüente de insuficiência cardíaca no Brasil e países vizinhos da América Latina (COTRAN et al., 2000), sendo causada pelo protozoário parasita intracelular Trypanossoma cruzi, cujos principais reservatórios são os seres humanos, cães, gatos e cobaias (BRENER et al., 2000). Ao disseminarem-se pela circulação sangüínea, os parasitas, atingem principalmente coração, esôfago ou cólon, penetram nas fibrilas musculares desses órgãos e repetem o ciclo intracelular (TANOWITZ et al., 1992). Diversas características reguladas pela apoptose em organismos multicelulares são essenciais para o ciclo de vida do T. cruzi (AMEISEN et al. 1996). Apoptose é uma forma de morte celular programada destinada a eliminar células do hospedeiro indesejáveis, através da ativação de uma série coordenada e programada internamente de eventos executados por um conjunto exclusivo de produtos gênicos, ocorrendo geralmente como resultado a uma agressão ou ativação dos receptores de morte celular (COTRAN et al., 2000; WILSON, 2002). O mecanismo da apoptose envolve uma cascata de eventos bioquímicos; alguns dos elementos desta cascata são a ativação de cisteína-proteases chamadas caspases, liberação mitocondrial de fatores de morte celular e, finalmente, mudança na característica morfológica nuclear e fragmentação de DNA (COTRAN et al., 2000; SMAILI et al., 2003). O objetivo deste estudo foi determinar a existência de níveis constitutivos de caspase-3 em miocárdio de cães na fase aguda e crônica da doença de Chagas.

MATERIAL E MÉTODOS

Foram utilizados 16 cães adultos, sete machos e nove fêmeas, sem raça definida, inoculados com a cepa de T. cruzi denominada Boliviana, isolada de um caso humano na Bolívia. A dose inoculada foi de 6000 tripomastigotas/kg de peso vivo por via intravenosa. Os grupos experimentais foram constituídos da seguinte forma (ALVES, 2003):

Seis cães do Grupo Chagásico Agudo que morreram subitamente e dois do Grupo Chagásico Crônico submetidos à eutanásia foram encaminhados à avaliação anatomopatológica. Durante este procedimento, foram colhidas amostras de miocárdio (ventrículo direito, ventrículo esquerdo e septo intraventricular). Os fragmentos já emblocados em parafina segundo a técnica de rotina (LUNA, 1968) foram laminados a 3 m m, desparafinizadas em xileno e a recuperação antigênica feita com solução de citrato pH 6.0 em microondas. Neutralizou-se a peroxidase endógena com uma solução de 60% de metanol e 40% de H2O2 por 10 minutos, seguida pelo bloqueio com albumina sérica bovina por 2 horas. Anti caspase-3 (Santa Cruz Biothechnology) foi incubado numa diluição 1/500 a 4ºC em câmara úmida durante a noite. Foi adicionado o anticorpo secundário de coelho biotilinado anti-IgG (Vector Laboratories). A reação foi detectada pela adição de diaminobenzino-peroxidase (DAB). Utilizou-se a hematoxilina de Harris como contraste e os cortes foram observados em microscópio óptico.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Inicialmente, foi possível observar que houve marcação constitutiva da caspase-3 no coração dos cães. É importante ressaltar que o anticorpo utilizado marca todas as formas da enzima, e não apenas a forma ativada. No entanto, foi possível perceber uma maior expressão da caspase-3 na fase crônica da doença de Chagas quando comparada à fase aguda. Isso não significa necessariamente que há maior apoptose na fase crônica, apenas maior expressão da enzima. Em ambos os casos, a marcação aconteceu nos endotélios e no miocárdio, distribuindo-se nitidamente nos cortes da fase aguda de forma interna aos ninhos de amastigotas, delimitando o espaço entre o tecido cardíaco e as estruturas parasitárias. A expressão da caspase-3 nas fases aguda e crônica da cardiomiopatia chagásica experimental verificada confirma o relato que a utilização do método de detecção da caspase via imunoistoquímica é apropriada para avaliação de tecidos danificados (KLIR et al, 2001).

A marcação da caspase-3 observada neste trabalho está provavelmente relacionada a um mecanismo de adaptação do T. cruzi. De fato, a apoptose pode contribuir para a persistência do parasita sem provocar uma resposta inflamatória exacerbada (SOUZA et al., 2003), fazendo do T. cruzi um dos exemplos mais impressionantes de como um parasita se beneficia manipulando o mecanismo apoptótico da célula do hospedeiro (HEUSSLER et al., 2001), demonstrando um mecanismo bioquímico de adaptação do parasita.

A expressão da caspase-3 em endotélios no miocárdio parece estar relacionada diretamente com a infestação do parasita no coração. A apoptose das células endoteliais ocorre nos capilares e vênulas cardíacas na miocardite chagásica aguda, provocada por mediadores da inflamação e não pela invasão das células endoteliais pelo T. cruzi. Este processo está associado ao aumento de espécies reativas de oxigênio na célula endotelial afetada, podendo causar destacamento endotelial e apoptose (ZHANG et al., 1999). No entanto, os efeitos do óxido nítrico (NO) durante a infecção com T. cruzi podem ser protetores ou tóxicos (SILVA et al., 2003). Constitui uma seqüência natural deste trabalho medir a expressão, nas mesmas condições, de enzimas relacionadas com o metabolismo do oxigênio no tecido, tais como i-NOS e as ciclooxigenases 1 e 2.

CONCLUSÕES

Os resultados permitiram concluir que a técnica de imunoistoquímica com a utilização do anticorpo anti-caspase-3 detecta níveis constitutivos da enzima no miocárdio de cães com cardiomiopatia chagásica experimental. Novas análises utilizando anticorpos específicos para a forma ativa da caspase-3 deverão ser realizadas.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Fonte de financiamento: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Fundo de Apoio a Pesquisa da UFG (FUNAPE), PROAD-UFG (PROAP).