Associativismo e Participação Política: O Orçamento Participativo e os Movimentos Sociais em Goiânia (2001-2004)

VILELA, T.P.

Faculdade de Ciências Humanas e Filosofia

E-mail: tvilela5@hotmail.com ; denise@fchf.ufg.br

RESUMO

Neste trabalho analisamos a relação entre os movimentos sociais urbanos, mais especificamente, as Associações de Moradores. O objetivo é verificar o nível de associativismo dos agentes sociais ligados as referidas associações e sua influência e participação Orçamento Participativo em Goiânia no período de 2001-2004. Por meio de entrevistas e aplicação de questionários observamos que Goiânia pode ser considerada uma cidade que possui uma tradição associativa e que esta foi de suma importância para a implementação do OP na capital, uma vez que este modelo de discussão e gestão do orçamento público depende principalmente da participação dos cidadãos.

Palavras-chave: Orçamento Participativo; Associativismo; democracia participativa; movimentos sociais urbanos.

INTRODUÇÃO

Goiânia, foi a primeira cidade do Estado de Goiás a implantar o Orçamento Participativo (OP), adotado desde 2001(primeiro ano da gestão atual petista), tendo como referência a experiência de Porto Alegre que é uma experiência participativa muito próxima do que se entende por democracia deliberativa (AVRITZER,2002 e LUCHMANN, 2002).

A literatura tem enfatizado a tradição associativa de Porto Alegre como um elemento de grande importância no processo de implementação do OP naquela cidade. Nesse sentido, foi importante analisar tal efeito em Goiânia, ou seja, se os movimentos comunitários também foram relevantes, ou não, e seu papel para implementação do OP.

O objetivo do estudo foi avaliar a relação entre as associações de moradores e o OP em Goiânia, dando um enfoque aos movimentos sociais que existiram e ainda existem nesta capital bem como a sua influência no âmbito da participação dos agentes sociais atuantes como Delegado ou Conselheiro do Orçamento Participativo.

Procuramos também, mesmo que superficialmente, avaliar se a influência exercida pelo Estado, observando que a prefeitura municipal atua como organizadora e articuladora dos diferentes setores e atores sociais dentro do OP, afeta, ou não, a autonomia das associações civis em Goiânia e também se as regiões desmobilizadas com menor tradição associativa são menos beneficiadas na definição de prioridades ou até mesmo durante a distribuição dos recursos orçamentários oriundos do OP.

MATERIAL E MÉTODOS

Para analisar as questões referentes ao Orçamento Participativo e o nível de associativismo dos agentes sociais da cidade de Goiânia, foi feito primeiramente um exame da bibliografia existente sobre o OP, movimentos sociais num sentido amplo e movimentos sociais em Goiânia. Realizamos entrevistas semi-estruturadas com presidentes de associações de moradores e técnicos da prefeitura municipal. Outro instrumento utilizado foi a aplicação de questionários (num total de 24), direcionados aos presidentes das associações de moradores existentes nos diversos bairros de Goiânia, procurando abranger todas as 12 regiões da capital. O plano amostral de nossa pesquisa foi feito estatisticamente de modo aleatório e probabilístico.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Mesmo sendo um programa criado por meio de uma ação governamental, o sucesso do OP depende totalmente da participação popular. Pois através das Assembléias, ou fóruns há maior possibilidade de democratização das informações, e a população tem um maior conhecimento da realidade do município passando a questionar e a cobrar ações políticas dos governantes para que os recursos públicos sejam corretamente aplicados ou que suas demandas sejam ouvidas e atendidas. Ao final da pesquisa, podemos afirmar que, de fato, o OP mudou a forma de interação dos cidadãos com a administração pública, democratizando a relação Estado-sociedade.

Desde 1989, foram implementadas mais de cem experiências de Orçamento Participativo em todo o país e seus diversos resultados dependem de inúmeros fatores tais como: o desenho institucional, o comprometimento do governo, a densidade da sociedade civil, o tempo decorrido desde sua implementação e a capacidade financeira disponível no município. Em Goiânia, a forma como são escolhidos os representantes da sociedade civil retrata a importância do OP como um vetor da "transformação social" e suas regras internas canalizam a participação da população (WRAMPLER, 2003).

De acordo com o Sr. José Magalhães Farias (diretor de Orçamento da Secretaria de Planejamento da Prefeitura de Goiânia), um dos entrevistados neste trabalho, para sabermos se o OP é prioridade ou não em um município, é necessário verificarmos a quantidade dos gastos de investimento da prefeitura transferidos ao OP, com base nessas declarações, observamos que o OP não é prioridade na cidade de Goiânia, já que apenas 10% dos gastos com investimento são a ele destinados. Se o nível de alocação das verbas destinadas ao OP for baixo, os cidadãos buscarão outros canais que os possibilitem saciar suas demandas (AVRITZER, 2003).

O Orçamento Participativo é uma instituição em desenvolvimento e ainda está em fase de experimentação em várias cidades, por isso não possui uma regulamentação legislativa, não se institucionalizou. Assim, a participação da população no momento da definição das prioridades não significa que ela está num mesmo patamar de discussão com as elites políticas, pois o executivo ainda intervém bastante na realização das obras.

Ficou evidente que a participação das pessoas tornou-se bastante significativa nas reuniões das associações de moradores após a implementação do OP, comprovando a teoria do capital social, ou seja, na medida em que o Associativismo e outras formas de participação vão se difundindo, gera um aumento da cooperação e conseqüentemente, da confiança social entre cidadãos e instituições e a população mostra-se bastante interessada em participar dos assuntos que dizem respeito a seu bairro (BAQUERO,2001).

Apesar do surgimento das entidades comunitárias e dos movimentos reivindicativos em Goiânia, nas décadas de 60 e 70, (por exemplo a Liga de Amigos da Vila Nova como a primeira entidade) não significa que a população seja altamente mobilizada e organizada como ocorre em Porto Alegre, denota que as várias entidades e movimentos aparecem somente para lutar por demandas específicas.

Comprovando o alto grau de envolvimento das pessoas com o processo do OP elas se mantêm atentas e atuantes. Exemplificando, caso uma obra não se efetive dentro de um prazo previsto para sua realização num bairro, grande parte da população participa de mobilizações reivindicando sua concretização, mesmo havendo estas manifestações isso não garante a realização da obra reivindicada pelas pessoas, ao contrário, o que tem prevalecido é a decisão do órgão governamental em detrimento da opinião popular, mesmo assim as associações não perdem sua autonomia, ao contrário, têm se fortalecido no decorrer do processo.

CONCLUSÕES

A população de Goiânia, ao contrário do que pensávamos possui uma longa tradição associativa, que teve início em 1947, com a fundação da Liga dos Moradores de Vila Nova. A partir daí, na busca de melhores condições de vida, a população organizou-se em diversos movimentos sociais, em especial movimentos de bairro, os quais passaram a lutar por causas específicas de cada região e organizar diversos tipos de manifestações contestatórias. Com o recente advento do OP, a população passou a se mobilizar para as reuniões e Assembléias.

Mesmo com a grande influência governamental sobre o OP (pois é a prefeitura quem organiza e articula diversos setores e atores sociais dentro do processo, limitando assim o OP, que tem autonomia apenas para indicar as obras a serem realizadas e estas terão que ser aprovadas pela Câmara de Vereadores e só então sancionadas pelo prefeito) as Associações civis em Goiânia - em especial, de moradores - cumprem sua função e continuam a representar os interesses coletivos de um dado grupo e/ou região e podem manifestar até contrariamente às decisões governamentais. Neste sentido, procuram preservar sua autonomia diante do governo municipal e do PT.

Sobre os representantes dos bairros junto ao OP, analisando os discursos dos entrevistados, observou-se a propensão de ser eleito (a) conselheiro (a) ou delegado (a) pessoas que já são líderes de Associação de Bairro. Isso ocorre devido à crença dos moradores de que o líder comunitário conhece bem os problemas e as necessidades do bairro onde moram.

Observou-se que quanto maior a participação das pessoas de um bairro ou região, maior é a possibilidade de suas demandas serem aceitas e aprovadas nas Assembléias do OP. Portanto, é de fundamental importância que todos os cidadãos participem dos acontecimentos no cenário público, pois só assim tomarão conhecimento dos limites e alcances da ação estatal, e poderão exigir que suas demandas e necessidades sejam supridas, evidenciando que os movimentos sociais contribuem para a participação e organização dos diversos agentes sociais na arena política.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AVRITZER, Leonardo. O Orçamento Participativo e a teoria democrática: um balanço crítico. in: A Inovação Democrática no Brasil. São Paulo: Cortez, 2003.

AVRITZER, Leonardo. Modelos de deliberação democrática: uma análise do orçamento participativo no Brasil. In: SANTOS, Boaventura de Sousa (org). Democratizar a democracia: os caminhos da democracia participativa. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002.

BAQUERO, M. Reinventando a Sociedade na América Latina: cultura política, gênero, exclusão e capital social. Ed. UFRGS, Porto Alegre, 2001.

LUCHMANN, Lígia Helena Hahn. Possibilidades e limites da democracia deliberativa: a experiência do orçamento participativo de Porto Alegre. Tese de doutorado apresentada à Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Filosofia e Ciências Humanas. Campinas, SP, 2002.

WRAMPLER, Brian. Orçamento Participativo: uma explicação para as amplas variações nos resultados. In: Avritzer, L. e Navarro (orgs). A Inovação Democrática no Brasil: O Orçamento Participativo. São Paulo: Cortez, 2003.

Fonte de financiamento

Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq