UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS

FACULDADE DE LETRAS

Departamento de Estudos Lingüísticos e Literários

 

 

 

 

Dicionários eletrônicos de formas verbais compostas do português do Brasil: tipologia das expressões com o verbo dar

 

 

 

 

Roberta Rocha Ribeiro

(Bolsista PIBIC)

roberta@letras.grad.ufg.br

(de 01/08/2003 a 31/07/2004)

 

 

 

Prof. Dr. Oto Araújo Vale

(Orientador)

otovale@yahoo.com.br

 

 

Goiânia

(de abril 2003 a julho de 2005)

2004

1. Resumo

Esta pesquisa tem como intuito coletar e classificar sintático-semanticamente expressões cristalizadas formadas pelo verbo dar no português brasileiro. Utilizando-se a Teoria do Léxico-Gramática como parâmetro e partindo do pressuposto de que não existem dois verbos que tenham exatamente as mesmas propriedades sintáticas (GROSS, 1975, 1982), a análise estrutural das expressões foi feita em forma de matrizes binárias simples: a cada linha corresponde uma expressão e cada coluna corresponde uma propriedade sintática. As expressões foram divididas em planilhas, cada qual com uma estrutura sintática diferente. Todo esse trabalho foi tecido através de programas computacionais, resultando em uma divisão das expressões em classes homogêneas. Tal metodologia facilita satisfatoriamente a consulta das mesmas.

Palavras-chave: expressões cristalizadas; verbo dar; Léxico-gramática; matrizes binárias.

2. Introdução

Esse projeto tem como meta classificar expressões cristalizadas do português brasileiro compostas com o verbo dar. As análises são embasadas na teoria do Léxico-Gramática e são organizadas em matrizes binárias, onde cada coluna corresponde a uma propriedade e cada linha a uma determinada expressão.

No estudo em questão, foram analisadas e classificadas 89 expressões cristalizadas do português do Brasil compostas pelo verbo dar. Essa pesquisa faz parte de um projeto maior, que é o Dicionário eletrônico de formas verbais compostas do português do Brasil. Em Vale (2001), foram recolhidas e analisadas cerca de 5.500 expressões. Contudo, naquele trabalho, não foram estudadas as expressões formadas com os verbos ser, estar, ficar, fazer, dar, ter e levar, devido à complexidade sintático-semântica e a alta produtividade de tais verbos.

A proposta deste projeto é, em resumo, recolher expressões cristalizadas construídas com o verbo dar e observar suas estruturas sintáticas para depois trabalhá-las semanticamente.

3. Metodologia

Esse estudo tem como base teórica a Léxico-Gramática (Gross, 1982). Essa teoria tem como idéia principal trabalhar sintaticamente a relação existente entre verbos com outros componentes formadores de frases. Mas vale ressaltar que a Léxico-Gramática não visa somente um estudo de âmbito sintático. Ela considera também a semântica, fazendo uma sobreposição com esses dois caminhos de análise.

(1). Ana deu com a língua nos dentes

(2). *A árvore deu com a língua nos dentes

Essas duas sentenças, sintaticamente, são perfeitamente aceitáveis, pois elas possuem um sujeito e um verbo com seus respectivos complementos. Contudo, (2) não é aceita no uso, porque a expressão "deu com a língua nos dentes" permite apenas sujeito humano. Chega-se a tal conclusão devido a uma observação pautada no significado. Com esses exemplos, nota-se que no estudo das expressões cristalizadas não é possível desassociar a sintaxe da semântica, sendo a Léxico-Gramática uma teoria bastante adequada para essa pesquisa.

Assim, após ler acerca da Léxico-Gramática e coletar expressões com verbo dar, o próximo passo foi separar as expressões cristalizadas das expressões compostas por verbos-suporte. Depois de separar as construções com verbos-suporte, dentre as quase 200 expressões com verbo dar coletadas, somente 89 foram classificadas como cristalizadas. E essas 89 expressões foram organizadas em matrizes binárias, onde cada coluna corresponde a uma propriedade e cada linha a uma expressão. Tal organização foi também embasada na teoria da Léxico-Gramática.

4. Resultados

Os resultados foram explicitados em seis matrizes binárias, que mostram as propriedades sintático-semânticas das expressões. O principal critério de classificação foi a estrutura sintática das mesmas. As propriedades foram colocadas de acordo com a seqüência da expressão. Observe o exemplo:

(3). Ana deu o fora

Primeiramente, na tábua em que esta sentença está localizada, foi tratado o sujeito. Como ela só permite sujeito humano, marcamos com o sinal "+" a coluna que corresponde a essa propriedade. A coluna subseqüente é a que retrata o sujeito não humano. Como esta expressão não admite sujeito humano, colocamos o sinal "-" nessa coluna. Na seqüência, está a propriedade determinante obrigatório. No exemplo em questão, não tem como descartar da expressão o determinante "o". Então, registramos a sua presença. Já a palavra "fora" é um complemento que também foi devidamente registrado na planilha. (3) não exige plural obrigatório de C1 e nem C2. Assim, as colunas: plural obrigatório de C1, preposição, C2 e plural obrigatório de C2 foram marcadas com "-". Há ainda nas matrizes uma última propriedade: os exemplos. Através dela é possível visualizar como a expressão é utilizada na língua.

5. Conclusão

Ao final deste relatório, percebe-se a importância de estudar as expressões cristalizadas construídas com o verbo dar, pois não existe nenhum estudo ligado a esse tipo de construção. Assim, este estudo contribuirá bastante para o Dicionário de formas verbais do português do Brasil.

Mesmo com a dificuldade em diferenciar expressão cristalizada e construção com verbo-suporte, conclui-se que o verbo dar é bastante produtivo, apresentando diversas propriedades sintático-semânticas.

O maior desafio encontrado no desenvolvimento desse projeto de pesquisa foi a distinção entre verbo-suporte e expressão cristalizada. Com essa dificuldade, constatou-se que a classificação dessas expressões é de fundamental importância, já que as suas propriedades são bastante diferentes da tipologia proposta por Vale (2001). Enfim, esta classificação aqui proposta ainda é preliminar, pois, na segunda fase desse projeto, essas expressões serão procuradas em grandes corpora e, após essa procura, a classificação de cada uma será devidamente revista.

6. Referências bibliográficas

GROSS, Maurice. Lês bases empiriques de la notion de prédicat sémantique. Langages, n.63, p. 7-52, 1981

GROSS, Maurice. Méthodes em syntaxe. Paris: Hermann, 1975

GROSS, Maurice. Une classification des phrases "figées" du français. Revue québécoise de linguistique, Vol. 11. n.2, p. 151-185, 1982

NEVES, Maria Helena M. A delimitação das unidades lexicais: o caso das construções com verbo-suporte. PaLavra n. 5, p. 98-114, 1999

VALE, Oto Araújo. Expressões cristalizadas do português do Brasil: uma proposta de tipologia. Araraquara, 2001. Tese (Doutorado) – Universidade Estadual Paulista, Araraquara 2001.

VAZA, Aldina Caroço Félix Rocha da. Estruturas com nomes predicativos e o verbo-suporte dar. Lisboa, 1988. Dissertação (Mestrado) – Universidade Clássica de Lisboa, Lisboa 1988

7. Fonte de financiamento: CNPQ