Sobre o conceito leibniziano de mônada

Relton S. Ramos Júnior

Dr. Jordino A. dos Santos Marques

Faculdade de Ciências Humanas e Filosofia

reltonjunior@hotmail.com

jordino@zaz.com.br

Palavras-chave: Leibniz, mônada, metafísica.

I - Introdução

A pesquisa que propomos teve por finalidade contribuir na elaboração do trabalho que vem sendo desenvolvido pelo Prof. Dr. Jordino Assis dos Santos Marques subscrito com o título A subjetividade moderna: o século XVII.

Neste sentido, nosso sub-projeto de pesquisa limito-se a estudar a noção conceitual de sujeito em Leibniz e, desta forma, recolher os elementos que formulam a filosofia leibniziana acerca da subjetividade.

Segundo a notória opinião de Dilthey (1833-1911) sobre o pensamento leibniziano, Leibniz foi quem mais contribuiu para completar a missão da filosofia, se tal missão consistir em elevar a cultura de uma época à consciência de si mesma. É justamente nessa característica universal assumida por Leibniz que se estabeleceu o foco de nossa dúvida, pois ambicionamos examinar como em uma filosofia tão ampla e polivalente pode ser construída uma filosofia do sujeito. Sabíamos, contudo, que Leibniz deixa transparecer seu pensamento acerca da subjetividade ao desenvolver uma conceituação de mônada em sua vasta quantidade de escritos. Desse modo, buscamos abordar a subjetividade leibniziana procurando identificar os principais elementos que formam o arcabouço de sua monadologia.

O filósofo alemão Gottfried Wilhelm Leibniz não nos legou uma obra direcionada especificamente para a teoria da subjetividade. O que existe é uma rica quantidade de escritos isolados dos quais podemos extrair conceitos/predicados de mônada e, assim, chegar à formalização teórica do sujeito enquanto indivíduo.

O objetivo geral da pesquisa foi buscar a compreensão dos principais elementos em jogo na elaboração do conceito leibniziano de mônada, imprescindíveis já que esse conceito é central para entendermos a teoria da subjetividade em Leibniz.

Os objetivos específicos constituíram-se em diferentes abordagens, mas redundam, todos, na tentativa de compreendermos a definição de mônada em Leibniz. Buscamos identificar as relações existentes entre: mônada e substância; mônada e a harmonia preestabelecida; mônada e o princípio da razão suficiente; mônada e Deus.

II - Materiais e Métodos

Para entendermos a noção leibniziana de mônada e, por conseguinte, estabelecermos os elementos essenciais à concepção de sujeito, centramos nossos esforços sobretudo na leitura de duas de suas obras: o Discurso de metafísica, publicado em francês em 1686; e A monadologia, publicada também em francês no ano de 1714 (dois anos antes de sua morte). Essas duas obras são de fundamental importância para a compreensão do pensamento de Leibniz acerca da subjetividade e, em certo sentido, se complementam, uma vez que ambas buscam abarcar todos os pólos de seu sistema metafísico, mas por perspectivas diferenciadas.

III - Resultados e discussão

O filósofo alemão Gottfried Wilhelm Leibniz, uma das principais expressões da recepção do cartesianismo no séc. XVII, construiu seu sistema filosófico apoiado fundamentalmente no conceito de mônada. Giordano Bruno foi o primeiro a propor uma definição mais desanuviada de mônada. Em La Ceca delle Cenere, este filósofo defende uma concepção metafísica de estrutura atomista, na qual os átomos não são considerados, como os dos antigos filósofos, materiais, mas animados, um vez que existe um infinito número de indivíduos que vivem não só em nós, mas em todas as coisas compostas. Leibniz busca essa definição desenvolvida por Giordano Bruno para elaborar e propor sua própria concepção de mônada.

As mônadas são substâncias desprovidas de partes ou extensão, portanto não apresentam figura nem divisibilidade possíveis (M. §3). Desta forma, ao contrário das substâncias compostas, as mônadas só começam ou terminam por criação ou por aniquilamento divino (M. §6). A mônada não pode ser alterada em seu íntimo por outra criatura qualquer, uma vez que "não tem janelas por onde qualquer coisa possa entrar ou sair" (M. §7). Elas são os verdadeiros "Átomos da Natureza" (M. §3).

A aparente dependência/influência de uma mônada para com outras se funda na harmonia preestabelecida por Deus (M. §87). O conjunto de todas as mônadas (que são infinitas) constitui o universo (M. §57). E como cada mônada aparentemente influi sobre todas as outras, e todas as outras aparentemente influem sobre cada uma, pode-se concluir que cada mônada é um espelho de todo o universo (M. §56). A mônada possui duas atividades fundamentais em seu interior: a percepção e a apetição. A primeira é o estado no qual se encontra a mônada, que revela seu grau de clareza com relação ao universo; a segunda representa a tendência que a mônada tem à aperfeiçoar-se, ou seja, passar de percepções obscuras para percepções cada vez mais claras (M. §14,15). As mônadas se distinguem entre si através dos níveis de percepção (M. §14). Quanto mais clareza a mônada tiver em seu estado de percepção, mais semelhante ela será a Deus.

Do que foi posto, então, uma questão se revela pertinente pois, sendo as mônadas elementos primordiais na constituição de todo o universo, e visto que as coisas do universo estão em uma constante relação de causa e efeito, é forçoso afirmar que, de alguma forma, as mônadas estabelecem comunicação entre si. De que modo pode ocorrer a comunicação entre as mônadas sem que estas sejam alteradas ou excitadas por alguma criatura exterior, posto que elas "não possuem portas nem janelas"? Esta é a pergunta que abordamos em nossa conclusão.

IV - Conclusões

Para explicar a comunicação intermonádica, Leibniz constrói a concepção de "harmonia preestabelecida" que, segundo Russell, é a marca do seu sistema. Toda substância, ao ser criada por Deus, é programada de tal modo que todos os seus estados naturais e suas ações futuras se realizarão em harmonia universal com todos os estados naturais e ações de cada uma das outras substâncias criadas. Isto acontece em sincronia tão perfeita com o que também está acontecendo com as outras substâncias que, dessa sincronização, resulta a aparência de causalidade externa, ou a aparência de que uma substância influi sobre a outra. Leibniz afirma que Deus teria colocado em cada mônada, no instante da criação, todas as suas percepções, criando-as de tal modo que cada uma se desenvolve como se estivesse só, uma vez que elas não têm qualquer abertura para o exterior. Seu desenvolvimento, contudo, corresponde, a cada instante, exatamente ao de todas as outras. Graças a essa harmonia preestabelecida, os pontos de vista de cada mônada sobre o universo concordariam entre si. Cada mônada é uma fonte independente de ação, atuando sem sofrer qualquer interferência, para sempre. Seguindo cada mônada sua própria lei interna, resulta a harmonia universal entre elas e, portanto, entre todas as coisas do universo. Há uma harmonia preestabelecia entre as mudanças verificadas em uma mônada e em outras, a qual produz a aparência de uma ação recíproca. Segundo Russell, isto, claramente, é uma extensão da idéia dos dois relógios, que batem as horas em um mesmo momento porque ambos marcam perfeitamente o mesmo tempo.

Assim, concluímos nossa investigação afirmando que Leibniz esboça uma linha de raciocínio argumentativa pela qual podemos vislumbrar uma possível solução para o problema da concorrência entre a comunicação das mônadas, que é um fenômeno completamente aparente, e a propriedade essencial da substância simples de ser totalmente fechada.

V - Referências bibliográficas

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LEIBNIZ,G. A monadologia. Tradução de Marilena Chauí. São Paulo: Abril Cultural, 1979 (coleção Os Pensadores).

______ Discurso de Metafísica. Tradução de Marilena Chauí. São Paulo: Abril Cultural, 1979 (coleção Os Pensadores).

______ Novos Ensaios Sobre o Entendimento Humano. Tradução de Luiz João Baraúna. São Paulo: Abril Cultural, 2000 (coleção Os Pensadores).

______ Essais de théodicée sur la bonté de Dieu, la liberté de l`homme et l`origine du mal. Edição franco-alemã, tradução de Herbert Herring, vol. II. Darmstadt: Wissenschaftliche Buchgesellschaft, 1985.

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