BIOLOGIA E CONTROLE DE MORCEGOS
SOUZA, A. M.1; JAYME, V. S.; TOMAZ, L. A. G.;
SANTOS, M. F. C.;CINTRA, J. A.; SOUZA, J. A.
Escola de Veterinária – Universidade Federal de Goiás
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airesms@vet.ufg.brPALAVRAS-CHAVE: Quirópteros, captura, Goiás.
INTRODUÇÃO
A ordem Chiroptera compreende o segundo maior grupo de mamíferos. De acordo com as revisões mais recentes, a ordem é constituída por aproximadamente 1.000 espécies e 177 gêneros pertencentes a 18 famílias de duas subordens: Megachiroptera, que contém apenas a família Pteropodidae, presente somente no Velho Mundo, e a subordem Microchiroptera, com as famílias restantes. Nas Américas são conhecidas cerca de 300 espécies, distribuídas em 10 das 17 famílias da subordem Microchiroptera. Destas, apenas três espécies são hematófagas, Diphylla ecaudata, Diaemus youngii e Desmodus rotundus, com distribuição limitada do sul do México ao norte da Argentina. O Desmodus rotundus é o principal transmissor da raiva aos herbívoros, que são suas fontes alimentares mais freqüentes, constituindo o ciclo rural da enfermidade. A enfermidade impõe grandes prejuízos para a pecuária da América Latina, estimando-se que se perde, anualmente, em torno de meio milhão de bovinos (FAO, 1996). O conhecimento da epidemiologia da raiva transmitida pelo morcego hematófago aos animais herbívoros demonstrou a necessidade de que se estabelecessem estratégias para sua prevenção. Estudos sobre a biologia do Desmodus rotundus foram essenciais na elaboração de um esquema de controle populacional seletivo. Há alguns anos acreditava-se que o hábito de lamberem-se mutuamente teria implicações exclusivamente higiênicas, atualmente se sabe que as fêmeas de Desmodus rotundus são fiéis ao grupo, não ao macho e que o comportamento de lamber a barriga funciona, também, como estímulo para regurgitação de sangue de uma fêmea alimentada para outra que não obteve sucesso em sua caçada. Essa descoberta induziu o raciocínio de uma maior eficácia da aplicação de pasta vampiricida em fêmeas, recentemente comprovado. A quantidade aplicada também é importante para diminuição do risco de contaminação ambiental. Atualmente, o controle da população de morcegos hematófagos pela aplicação de pasta vampiricida no dorso de morcegos capturados é o método recomendado e mais difundido entre técnicos e produtores rurais. Estima-se que para cada morcego tratado com a pasta de warfarina 2% em média 20 morcegos são mortos. Como estratégia didática na formação do Médico Veterinário, a Escola de Veterinária da Universidade Federal de Goiás mantém, desde 1986, o projeto conhecido como "BATNIGHT", devidamente cadastrado na Pró-Reitoria de Extensão da Universidade e desenvolvido por uma equipe composta por professores, alunos e técnicos, que atenderam, de 1986 a 2004, 23 propriedades rurais localizadas em sete municípios goianos onde foram registrados casos de raiva. Dentre outras atividades conduzidas no período, as equipes identificaram diferentes tipos de abrigos de morcegos, realizaram capturas de morcegos, com posterior identificação de espécies e encaminhamento para pesquisa de atividade viral, e exerceram atividades de educação em saúde junto às comunidades locais, principalmente sobre biologia e controle de quirópteros e sobre epidemiologia e controle da raiva.
OBJETIVOS
Capturar e identificar espécies de quirópteros ocorrentes em diferentes municípios do Estado de Goiás, contribuindo para ações racionais de controle.
MATERIAL E MÉTODO
Foram selecionadas 23 propriedades rurais localizadas em sete municípios goianos onde foram registrados históricos de agressão por quirópteros e/ou casos de raiva animal. Desde o início das atividades, têm sido conduzidas atividades de cadastramento de abrigos e captura de morcegos em redes armadas ao redor de currais, instalações rurais e abrigos noturnos, além de posterior identificação de espécies, encaminhamento para pesquisa de infecção viral e coleta de dados. Além disto, vêm sendo desenvolvidas ações de educação em saúde junto às comunidades locais, enfatizando a biologia e controle de quirópteros e sua importância na epidemiologia da raiva. Posteriormente, as informações obtidas foram tabuladas e analisadas com auxílio do Programa Excell.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
O saldo de capturas foi de 299 animais, sendo que a maior parte dos morcegos capturados ao redor dos currais foram não-hematófagos, 116 (73,4%) contra 42 (26%) hematófagos. Capturas realizadas em abrigos apontaram um número superior de morcegos hematófagos, 117 (82,9%), em relação a não-hematófagos, 24 (17,1%). A maior captura, de 49 hematófagos, foi realizada numa mina abandonada no município de Catalão, em 2001, e a menor, com apenas um exemplar hematófago, em Jaciara em 1993. A espécie Desmodus rotundus foi a única hematófaga registrada em capturas efetuadas nos diferentes municípios do Estado, tendo sido identificada em 53,2% do total de espécimes capturados, dos quais 27 espécimes foram remetidos para pesquisa de vírus rábico, 11 encaminhados para os laboratórios da Escola de Veterinária para taxidermia e os demais devidamente tratados com pasta vampiricida e soltos. Dentre os hematófagos capturados foram separados 64 espécimes para sexagem, que revelou uma taxa de 45,3% (135) de indivíduos machos e 54,7% (164) de fêmeas. O levantamento apontou oito tipos de abrigos, entre naturais e artificiais, mais freqüentemente encontrados na região. Os abrigos cadastrados e a porcentagem de capturas foram, por ordem: minas abandonadas, 16,4%; cavernas, 15,7%; túneis, 5,4%; bueiros, 3,3%; grutas, 3,0%; margens de rios, 2,0%; sulcos abaixo de linhas férreas, 0,7% e rochedos, 0,7%. Os morcegos não-hematófagos capturados foram soltos após a identificação. Destaca-se que estudos sobre o Desmodus rotundus são vitais não apenas para controle da raiva, mas para a compreensão sobre sua interação e implicações com outras espécies, particularmente no que se refere à cadeia alimentar e suas repercussões no equilíbrio ecológico, contribuindo para a sobrevivência equilibrada da espécie.
CONCLUSÕES
A captura e identificação de quirópteros ocorrentes em diferentes municípios de Goiás revelaram o predomínio de espécies não hematófagas e da espécie Desmodus rotundus como única hematófaga, tendo-se detectado diferentes abrigos, entre naturais e artificiais. As informações obtidas, além de embasarem ações racionais de controle e de sobrevivência equilibrada das espécies, subsidiarão futuras pesquisas, contribuindo para elaboração de estratégias de controle da raiva no Estado.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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